Imagination is more than knowledge. Einstein
Lançar os fundamentos da computação hermenêutica
é uma das etapas do meu projeto de pós-doutorado para a FAPESP.
A primeira parte desse relatório relata a aventura da consciência
artística como vivenciada por seus mais capazes representantes no
século XX. E o objetivo aqui é esclarecer que se os
cientistas da computação não forem expostos o mais
cedo possível em sua formação a essa vivência
com a arte dificilmente atingirão os objetivos de simular a consciência
humana em sua mais elevada expressão e colocar as linguagens computacionais
holísticas tais como as baseadas em orientação a objetos
centrados no protótipo a serviço da urgente demanda por melhoria
da qualidade de vida no planeta.
A conquista na literatura de maior expressividade como mostro na secção
sobre Heidegger foi influenciada pelas novas concepções da
física. Se os escritores e poetas conscientemente tiveram de inventar
formas mais expressivas para comunicar suas idéias, porque os cientistas
da computação não podem fazer o mesmo? E de fato o
fazem, mas a imensa maioria de programadores não possuem a mesma
genialidade.
Reciprocamente se os artistas não forem treinados para
entender as novas concepções sobre espaço e tempo
e matéria e gravidade, nunca se poderá desenvolver sistemas
biotecnológicos complexos respeitando a terra (o terreno) como sendo
o universo inteiro.
Ao se analisar as contribuções de artistas e filósofos
e cientistas, percebe-se a dificuldade em estabelecer a unidade entre religião,
arte e ciência como uma conquista que transpareça
na vida de cada cidadão ou cidadã.
Mais ainda, o objetivo ao dispender precioso tempo, descrevendo
como os artistas realizaram suas obras-de-arte e seu relacionamento
com os elementos da obra-de-arte é para mostrar que esses
mesmos processos cognitivos estão envolvidos, quando desenvolvo
o meu modelo de ecodesign. Quando Brancusi fala que é enquanto
você esculpe...que você descobre o espírito do seu material
e as propriedades peculiares a eles. Sua mão pensa e segue os pensamentos
do material. é exatamente assim que me submeto humildemente
de corpo e alma às exigências do meu material, no caso o modelo
dependente do domínio, o modelo geométrico e o modelo computacional.
Sou fiel aos aspectos imanentes e transcendentes do objeto arquitetônico
que devem ser manifestados.
É importante enfatizar aqui a complexidade envolvida para captar
essa miríade de aspectos e transformá-los em consciência
geométrica. Transmitir o que significa isso a um público
interdisciplinar e não-especialista muitas vezes em nenhuma das
áreas específicas em que se situa minha pesquisa é
tarefa árdua. Porisso acredito que essa aproximação
vai preencher uma lacuna entre o meu modelo e a capacidade hermenêutica
do pesquisador em reagir ou responder a ele de acordo com o seu valor semiótico
real. E também através da análise do projeto autopoiético
do Pavilhão Holandês da Expo2000 que já está
pronto perceber que a arquitetura não é mais arranjar blocos
de acordo com a geometria euclidiana e decorar fachadas [Mele99].
Galgar os mais vertiginosos picos bem como explorar os mais recônditos
mundos subterrâneos se torna mister para desbravar as intricadas
trilhas e descortinar horizontes cada vez mais amplos da inesgotável
floresta informacional que se estratifica nas camadas cultural, biológica
e artefatual.
Por um lado,esta vem possibilitando o desdobramento gradativo
do ser em sistemas sócio-biotecnológicos complexos.
Por outro lado, abre as portas para o desenvolvimento de
sistemas computacionais abertos a ponto de gerar máquinas quânticas
como resultado da visualização e manipulação
do átomo através da nanotecnologia capazes de grande capacidade
de memória bem como de simular a própria consciência
humana.
A interação informacional inter-multi e transdisciplinar
se operacionaliza através de mecanismos que viabilizam a transformação
dos artefatos concebidos até hoje por um mental caracterizado
por processos cognitivos antes racionais e seqüenciais em sistemas
vivos, autoorganizados tendendo a imitar a natureza hermenêutica
e autopoiética da natureza.
A transição da consciência mental para a consciência
supramental ou espiritual que é característica da arte, permitindo
essa transformação só ocorre, quando o indivíduo
começa a perceber que o intelecto é capaz de perceber o sim
e o não de uma mesma questão. Isso o força a
descobrir as verdadeiras forças que desencadeiam essa percepção.
Surpreso acabará gradativamente percebendo que são as mesmas
que atestam da unidade entre a religião, arte e ciência.
Portanto trata-se aqui de processos cognitivos inteiramente novos e
que não são sequer incentivados no sistema educacional
instituído. No entanto, é o modo natural de ser dos
grandes gênios que impulsionaram o progresso científico, cultural
e espiritual da humanidade.
O esquema a seguir mostra o desdobramento do ser possibilitado pela
floresta informacional de acordo com o espectro que vai de rocklike
things até spiritual like things por intermédio de thoughtlike
things .
Embora esse esquema não reproduza a realidade de modo holístico,
desafia o nosso intelecto e agudiza a nossa percepção. Por
exemplo, os sistemas que se auto-organizam podem ser biológicos
ou não-biológicos. Assim o pensamento se introjeta nesses
sistemas. De particular interesse para o meu relatório é
o pensamento visual característico dos cristais. O artista gráfico
M.C. Escher utiliza os grupos de simetria do plano e os do plano sem ponto
para expressar o infinito. Os grupos de simetria de similaridade e similaridade
conforme são fractais. Os templos hindus 500 a.C. expressavam as
altas esferas espirituais através da geometria fractal. Apenas em
1977 através de Mandelbrot o Ocidente despertou para essa nova consciência
geométrica.
Acostumados a um ensino compartimentalizado mal percebemos as
diferentes dimensões do ambiente em que estamos mergulhados. Conseqüentemente
os processos cognitivos associados para se entender essa complexidade que
o esquema deixa transparecer não são estimulados, levando
ao atual impasse que a hnumanidade enfrenta. Não estamos acostumados
a pensar o complexo partícula quântica rocklike – onda piloto
quântica thoughtlike associada ou seja a natureza dupla dascoisas
do mundo que nos cerca.
Rocklike things partículas clássicas
ondas clássicas rocklike
corpo
cérebro
Thoughtlike things silicon-chip
moléculas inteligentes
sistemas que se auto-organizam: biológicos:
mente
‘abelhas’
‘formigas’
compostos
orgânicos
complexos
não-biológicos: cristais
sistemas autopoiéticos
sistemas alopoiéticos:
produto manual
feito à máquina
intelectual : software
Kunstdinge:
os carvalhos de Beuys
os combinados de Rauschenberg
poesia-coisa de Rilke
produto-de-arte: Sanduíche Ecológico
(Pavilhão holandês/Expo2000)
partículas quânticas thoughtlike
um quantum de energia = um quantum de informação = infon
Spirituallike things
obra-de-arte: templos hindus
obra de Escher
sistemas baseado em conhecimento autopoiéticos
música
Deus
quantum chip
consciência humana
onda piloto quântica thoughtlike
Figura 1. Desdobramento do ser de acordo com a árvore do conhecimento.
Vou recordar aqui as origens implícitas desse comportamento.
Na Grécia arcaica, a noção de physis (lei-natureza)
formava uma unidade. Nos sentimentos dos gregos antigos, nomos é
primariamente a justiça distributiva da qual ninguém podia
escapar. Cada qual tinha acesso a um terreno durante sua existência
sem necessidade de leis escritas. Com o advento da moeda e a mudança
da comunicação oral para a escrita, um novo espaço
e tempo político surgiu acompanhado com a dissolução
do basileus – figura central do poder comunitário arcaico.
A lógica da polis prevaleceu e então a dissociação
do cosmos.
Isso abriu as portas para a concepção de Platão
da criação do cosmos como um Demiurgo cuja criação
é anthropoi, humana e masculina, fazendo nos ver a Terra como um
recipiente passivo. A separação da physis e do cosmo
bem como a segregação das mulheres levou a um comportamento
entrópico em relação ao terreno e ao planeta.
Mais ainda, Platão estava interessado no Sendo (Being, Étant)
ou no mundo das formas eternas.
Aristóteles refutou suas idéias e introduziu o método
científico na Terra. Suas idéias despontaram no horizonte
em sintonia com as idéias científicas da auto-organização
e já combatia a degradação ambiental no tempo dos
gregos. Para ele, a pesquisa física deve lidar com condições
e características dos objetos físicos sem contrastá-los
com as propriedades das coisas eternas. Isso causou departamentalização
mas émais que um método. Acarreta uma certa autonomia para
o assunto tratado. Em resumo, Platão se ocupa dos motivos
transcendentais e Aristóteles dos motivos imanentes. Com o
advento da possibilidade de se modelar a consciência humana através
do quantum chip, já é tempo para se incorporar esses
aspectos imanentes e transcendentes nas nossas aproximações
[Lour971], [Lour97b].
Ao longo desse relatório, o pesquisador vai perceber que os
processos cognitivos platônicos e aristotélicos se cruzam
eo chão parece que vai desabar enão se sabe mais qual direção
tomar.
De fato, o aparecimento do mensageiro de Deus o Báb e sua Declaração
de 1844 sobre a vinda do manifestante divino da Era Moderna, Baha’u’llah,
fundador da fé baha’i na Pérsia e anunciado por todas as
religiões torna a análise de qualquer texto sobre arte ou
filosofia baseado nas teorias platônicas difícil. Pois são
inconsistentes com o atual estágio de evolução conquistado
pela sociedade humana graças à emancipação
da mulher, o advento da era da sustentabilidade onde a Mãe Terra
é a Gaia de Lovelock e a era da cidadania.
Curiosamente não só o Báb e o Bhaú’llah
são herdeiros do pensamento socrático e platônico,mas
tambémo Báb se oferece ao sacrífício tal qual
Sócrates para abrir caminho à doutrina de Baha’u’llah.
Ambos subvertem a visão platônica sobre a Mãe Terra
e a mulher. Pregar a igualdade da mulher na prisão na Pérsia
no século passado é algo que transcende a compreensãomental.
Mais ainda confessar que era inspirado por uma moça pura que
lhe aparecia nos momentos mais difícei. Anunciou com segurança
o advento da mulher, a globalização e a infoera.
No Canal Espiritual de minha dissertação de Mestrado,
organizo filmes internacionais, música e novelas brasileiras, orbitando
ao redor da ópera A Flauta Mágica de Mozart, que obviamente
trata dos processos de individuação da mulher baseado
em ideais platônicos. Mas modifico o seu final que aponta para
idéias aristotélicas e em consonância com os
ensinamentos baha’i’s. Só me tornei baha’i em 1992.
Já o meu modelo de ecodesign não é apenas uma
indubitável valorização da Mãe Terra. É
uma verdadeira aproximação baseada no Becoming aristotélico
ao invés do platônico Being. A sua natureza é
totalmente emergente e aprendo com ele a cada instante, ao invés
de lhe ditar regras de cima para baixo.
As diversas secções a seguir esclarecem o esquema da
figura 1. Espero com essa aproximação que o pesquisador perceba
que só rompendo fronteiras e ampliando horizontes é que se
chega ao cerne dos aspectos transcendentes e imanentes que tal qual a mão
e a luva estão envolvidos no modelo dependente do domínio
e se refletem nos modelos geométrico e computacional num processo
semcostura tal como o sistema baseado em conhecimento para gerar cidades
sustentáveis que venho desenvolvendo.
O fato de ser sucinto, baseado nas ondas primárias e nos processos
homeostase, continuidade, diferenciação e repetição
que tratam das relações do objeto arquitetônico com
o meio ambiente e nas ondas secundárias que introduzem a consciência
geométrica baseada nos grupos de simetria do plano e do plano
sem ponto e imitam a liberdade intrínsica do artista aplicados
aos elementos arquitetônicos a saber conforto ambiental, sistemas
estruturais, atividades, instalações hidráulicas,
etc reflete a minha formação em literatura, arte e
ciências biológicas aliada a um raciocínio físico,
matemático e espiritual.
I. A unidade entre a religião, arte e ciência
Corajosamente inspirada nos conhecimentos da mecânica pós-quântica
[Sarf00], deixo transparecer aqui que a elaboração do meu
modelo de ecodesign vem ocorrendo em um nível além do mental.
Se o homem já pode elaborar máquinas espirituais que simulam
a consciência humana, para o próprio bem da humanidade devemos
exigir desses cientistas que essa consciência se assemelhe
à dos gênios. Nesse caso, não há o que temer
mas o relato a seguir é para provocar a suspeita de que chegar nesse
nível seria conferia à máquina poderes que só
Deus transmitiu ao homem. ONGs deveriam começar a se movimentar
para garantir que essas máquinas estarão a serviço
do bem estar da humanidade, enquanto uma entidade única.
O meu modelo de ecodesign representando o modelo dependente do domínio
foi desenvolvido no Mestrado (1985-1988) e os modelos geométrico
e computacional, reflexos desse reforçando sua natureza hermenêutica
e autopoiética no doutorado (1993-1998). É uma vasta aplicação
de conhecimentos, por um lado refletindo minha formação
em biologia e arquitetura portanto favorecendo a transformação
do conhecimento em coisa, em artefato em objeto arquitetônico. Por
outro lado, sou genotipicamente física e a abertura da terceira
visão ocorrida em15 de junho de 1976 contribuiu para revelar os
processos intrínsicos aos fenômenos físicos, quânticos
e pós-quânticos que impressionam nossa consciência.
Isso permitiu que apresentasse o período de minha vida entre
15 de junho de 1976 a 14 de junho de 1988 como um mero produto de tese!!!
O canal espiritual representa a minha atuação no corpo astral
na forma de filmes, novela e músicas. É uma interação
global em termos de comunicação extra-sensorial. A
mecanica pós-quântica de Jack Sarfatti explica cientificamente
como isso pode ocorrer. Sócrates se pronunciava que a maior virtude
era a coragem. Sem essa, todas as outras virtudes pouco fazem para mudar
a superfície do planeta.
Portanto, é inútil tentar ensinar às pessoas como
modelar, reduzindo o conhecimento ao aspecto meramente mental e cognoscível.
No entanto, para atingir os meus objetivos pretendo me tornar cineasta
e simultaneamente fundar uma ONG para construir cidades sustentáveis.
É necessário ensinar as pessoas a conviverem umas com as
outras e nada melhor do que colocando como base o desenvolvimento de
processos cognitivos que liberam o potencial criativo humano.
A essência da arte segundo Heidegger é revelar
a verdade.
Todos os artistas abstratos que iniciaram o Movimento Moderno estudavam
teosofia. Até que ponto tinham consciência das coisas que
sei, não se sabe, mas tenho certeza de que sua consciência
era pós-quântica. Até que ponto Kandinsky não
era capaz de prever as Grandes Guerras e a Revolução Russa?
O fundador da fé baha’í Baha ‘ú’llah na Pérsia
a partir de 1844 na prisão previa isso. Elegantemente toda sua doutrina
se baseia em princípios aparentemente mentais e modernos! De fato
a modernidade começou com ele.
Assim se Wheeler, Sarfatti, Penrose, Hofstadter, Bohm não hesitam
em se vangloriar dos progressos da mecânica pós-quântica
a ponto de se produzirem computadores quânticos que simulariam a
consciência humana, porque devo calar essas informações
que estou passando agora se já se tem conhecimento científico
para elucidá-las?
É claro além de facilitar a compreensão do que
vou introduzir a seguir onde procurarei me manter num plano mental
principalmente, essa corajosa aproximação desencadeia
“insights” no pesquisador, fazendo-o perceber que se quebrar o seu
ego, os potenciais que jazem latentes em seu verdadeiro eu são ilimitados.
Tal como o efeito Lorenz, se uma borboleta voando em Moscou é capaz
de produzir um tornado na América do Norte, de que não é
capaz um ser consciente? Será que as máquinas quânticas
imitarão o tipo de consciência que estou descrevendo?
Assim num contexto o mais amplo possível, esta floresta
apresenta por um lado uma gama de informação que tenta apreender
desde a totalidade do macrocosmo até a a mais ínfima partícula
do nanocosmo. Por outro lado, seu crescimento vertiginoso se deve
à espécie humana e aos misteriosos processos cognitivos que
o espécime homem apresenta.
Portanto, num ato de auto-reflexão é relevante
adentrar nos processos cognitivos globais do homem relacionados quer seja
à religião, arte ou ciência.
Salta aos olhos que existem “três mundos cognitivos”, a saber,
o Platônico, o físico e o mental [Penr95]. Platão imaginava
alguns cidadãos presos numa caverna algemados, de modo a não
poder ver as formas perfeitas atrás deles que eram projetadas como
sombra da luz do fogo em frente delas. As formas perfeitas representam
as formas matemáticas e as sombras, o mundo fisico real. O mental
é o domínio da filosofia, simbolizado pelo uso da razão.
Cada vez mais se percebe que o que existe é um mundo cognitivo uno
onde predomina um ou outro desses aspectos que podem levar tanto a soluções
acertadas quanto equivocadas.
Alfredo Pereira Jr [Pere94] mostra como as filosofias de Hegel e Aristóteles
se afinam com as idéias científicas da auto-organização.
Solmsen [Solm60] esclarece que na Física, Aristóteles
lida com as condições e características dos objetos
físicos sem contrastá-los com as propriedades das coisas
eternas. O mundo das formas não é mais como no Timeu o background
a partir do qual os acontecimentos no mundo real são desencadeados.A
discussão do lugar não necessita realidades que não
estão no lugar como um contraste para aqueles que estão.
O tempo pode ser entendido sem referência à eternidade.
Isso pode ser compartimentalização, mas é cada vez
mais um método e um hábito mental (reducionismo x holismo
[Hofs80]).
Carrega consigo uma certa autonomia para o sujeito assim tratado.O
que deve ser estabelecido para a física e de fato no começo
dela é a natureza dos princípios físicos básicos.
Mas logo, torna-se claro que esse sujeito e a realidade contraditória
da gênese da criação se tornam tão entrelaçados
que é impossível discutir um sem prestar atenção
ao outro (a fusão do reducionismo/holismo ocorre, apresentando-se
como um terceiro modo principal de processo cognitivo – característico
da arte). Deve-se sempre ter em mente os aspectos transcendentes (platônicos)
e os imanentes (aristotélicos) de uma questão. Espero que
minha exposição promova essa abertura no pesquisador.
Já um dos maiores desafios à razão humana é
a teoria Pinda-Brahmanda de uma escola de filosofia hindu que propõe
a existência de uma correspondência entre o macrocosmo e o
microcosmo. O cosmos inteiro pode ser visualizado como ontido numa cápsula
microcósmica,com a ajuda do conceito de elemntos sutis chamados
‘tanmatras’. O princípio cósmico total se replica
continuamente em escalas cada vez menores. Assim inclusive o homem contém
dentro dele o cosmos inteiro. (Eu sou o cosmos, ressona com a minha introdução
acima!). Baseados nessa concepção metafísica, a arquitetura
do templo hindu se desenvolveu 500 a.C. Há uma correspondência
entre as formas desses templos e as imagens geradas por computador baseadas
na geometria fractal de Mandelbrot (1977!).
A nova mecânica pós-quântica de Jack Sarfatti [Sarf00]
tendo o físico David Bohm como precursor corrobora cientificamente
semelhante estrutura de pensamento. Porisso servirá como estrela
guia na ‘incursão’ ao território enigmático da arte
e filosofia. Elucidar a natureza dos processos cognitivos se torna mister.
Sua dupla natureza fica cada vez mais evidente ora se apresentando como
partícula ora como onda imitando o comportamento da luz.
Embora cada vez mais os desenvolvedores de software como Dough Lea
lamentem “If only software engineering could be more like X onde
X significa alguma profissão relacionada ao design, estão
longe de apreender o que significa organizar o conhecimento por situação
ou baseado no artefato real ou intelectual. Processos cognitivos
dos mais simples na arte tais como o raciocínio analógico
que qualquer artista exercita através do desenho não fazemparte
do dia a dia da maioria dos profissionais. O simples querer desenhar implica
na abertura de uma visão interna conduzindo a processos pós-quânticos.
E que dizer dos processos cognitivos hermenêuticos emergentes intrínsicos
à natureza da arte e que se assemelham ao jogo ou à experiência?
Devido à estrutura precária do pensamento racional baseado
na linguagem, a qual não apresenta níveis de abstração
correspondentes aos que são desenvolvidos na arte, semiótica,
religião, cálculo infinitesimal, teoria da catástrofe,
fractais, etc, optei por mostrar como representantes da arte e da literatura
desse século venceram essas dificuldades.
O pesquisador interessado numa abordagem mais profunda poderá
recorrer a minha dissertação de Mestrado [Lour88] e tese
de doutorado [Lour98] que explicita esses níveis de abstração
através da aplicação da teoria da catástrofe,
dos grafos, dos grupos de simetria do plano e do plano sem ponto, semiótica,
etc. Apenas que esse conhecimento foi tecido para desenvolver especificamente
o modelo de ecodesign para gerar e planejar cidades sustentáveis.
Desse modo os processos cognitivos envolvidos no desdobramento e modelagem
da consciência artística não são explicitados
e o modelo de ecodesign é de difícil compreensão para
quem não é um arquiteto e desenhista urbano sustentável.
Mas exemplifica claramente através do modelo do ecodesign e seus
modelos geométrico e computacional o jogo hermenêutico e autopoiético
da consciência artística ao imitar a vida.
Na próxima secção, procuro deixar o pesquisador
mais confiante, mostrando como a nova ciência da consciência
baseada nos conhecimentos pós-quânticos facilita a compreensão
da unidade entre a religião, ciência e arte.
I.1 Processos cognitivos envolvidos na formação
da sociedade moderna e suas falhas
Os físicos quânticos iniciaram a nova ciência
da consciência, culminando na Post-quantum Theory de Jack Sarfatti.
Seu último paper Progress in Post-Quantum Theory se encontra em
suas home pages http://www.well.com/user/sarfatti/index/html ou
http: //stardrive.org/title.shtml .
Jack Sarfatti baseado nas teorias da consciência de David Bohm
iniciadas na década dos cinqüenta [Bohm52] [Bohm80], [BP87],
John Archibald Wheeler [Whee98] e Henry Stapp [Stap97] propõe os
seguintes níveis de consciência:
Nível 1 da matéria-geometria onde partículas e
campos elétricos, magnéticos, gravitacionais, etc no espaço
físico tridimensional mudam no tempo.
Nível 2, não material mas físico,guiando campos
de informação quântica fora do Nível 1 material.
Nível 3 pós-quântico é o campo da consciência
espontânea onde qualidades ligadas à experiência do
incognoscível ocorrem. Conhecido como Alma.
O físico Wheeler [Whee98] descreve o nível 2 como everything
is information, coincidindo com a semiótica do matemático
Peirce que será abordada em
Henry Stapp se refere ao nível2 como teoria quântica da
mente-matéria [Stapp97].
Já para o físico David Bohm [Bohm51] e David Peat [BP87],mente
é igual ao campo da informação quântica.
Esses físicos percebem que uma teoria universal da consciência
necessita explicar todos os fenômenos relatados pelos místicos.
Além disso tem de ser uma teoria para todas as Mentes,humanas
ou não. O nívelatingido pela teoria pós-quântica
de Sarfatti já satisfaz essa condição.
Esta realiza o princípio de relatividade de Einstein concebido
no Nível 1 no Nível 3. A consciência (sentience) é
a curvatura do nível 2 do campo de informação quântica
pelo nível 1 da matéria-geometria bem como o nível
1 da gravidade universal é a curvatura do nível 1 geometria
pelo nível 1 matéria como mostrou Einstein em 1915. A mente
é não-material, não-Nível 1,mas física.
Ocorre aí um completo entrelaçamento.
As propriedades dos campos de consciência pós-quânticos
segundo Ken Jenkes [http1]:
Apreciação da beleza e êxtase
Senso de humor
Criatividade original e imaginação
Amor e responsabilidade e engajamento a ponto do auto-sacrifício
Escolha consciente
Apreciação do encantamento
Apreciação do desconhecido
Auto-transcendência que deve ultrapassar o estreito ego.
Sarfatti adverte que o ego equivale à limitada unidimensionalidade
de Herbert Marcuse,descrevendo a Big Science como dominada por homens de
baixo nível espiritual que tem um problema com the vision thing.
Esses cientistas não desenvolveram em si as propriedades do
nível 3 do campo pós-quântico da consciência
da informação mental e o resultado é o desvio de enormes
recursos para pesquisas cujo resultado para a evolução da
consciência humana de acordo com essas propriedades é duvidoso.
Existe mesmo uma drenagem injusta de recursos pelos países industrializados
para realizar tais pesquisas, levando a mais gastos com armamentos para
se defender o patrimônio desses países, ao invés de
se buscar a unidade humana tão bem expressa por Bahaú’llah,
o fundador da fé baha’i em 1844: A Terra é um só
país e seus habitantes, seus cidadãos.
Curiosamente a sua previsão Haverá de chegar o tempo
em que a necessidade imperiosa da convocação de uma vasta
e ampla assembléia de homens será universalmente percebida.
Os governantes e os reis da Terra terão de tomar parte nela e, participando
nas suas deliberações, deverão considerar métodos
e meios capazes de assentar os fundamentos para a Paz Maior,
mundial, entre os homens [Casa85] acaba de se concretizar na Cúpula
do Milênio realizada nos dias 6, 7 e 8 de setembro na sede da ONU
em Nova York, visando a paz mundial no Terceiro Milênio. Reuniu
mais de 150 chefes de estado. Além disso se na Rio-92 apenas 60
delegados dos 20000 representantes das 8000 ONGs foramadmitidos nas mesas
redondas dos chefes-de-Estado,agora qualquer delegado poderá apresentar
suas propostas através do encaminhamento da Carta do Fórum
do Milênio realizado em maio na ONU pelas ONGs. Esse conteúdo
é idêntico aos tópicos principais abordados por Baha‘u’llah
para a realização da paz mundial na Terra [Mill00].
Se Sarfatti critica os cientistas obsecados pelo ego, o mesmo se pode
dizer desses chefes de Estado. Encontraram-se num panorama mundial onde
a crise causada pelos altos preços de petróleo ameaça
paralisar a economia ocidental. Ao invés de procurarem soluções
para a possibilidade real de esgotamentos de recursos não-renováveis,
atrelam-se a querer manter a situação que os trouxe ao atual
desenvolvimento baseado no consumo de três quartos dos recursos e
energia do mundo!!
A teoria do nível 1 de Shannon da informação clássica
é para a matéria. A nova teoria de Bohm do nível 2
de informação quântica é pré-requisito
para a mente. A mente é o diálogo ou troca entre os nível
1 de informação de Shannon e o nível 2 de informação
de Bohm. Pode-se pensar o nível 1 como corpo, o nível 2 como
mente e o nível 3 como espírito. É um tipo de princípio
da Trindade.
A movimentação mundial de ONGs desde a década
de oitenta, contando com a participação maciça das
mulheres indica que essa globalidade é inerente ao ser humano, independente
do seu nível educacional, pois foram as mulheres da África
as primeiras a alertarem sobre as conseqüências da escassez
de recursos. São mais holísticas que os homens, pois realizam
a tarefa de educar os filhos também [Ecod ].
Newton percebia a unidade entre ciência e religião.
Baha’u’llah se posicionava explicitamente pela unidade entre a religião,
arte e ciência. Os rumos atuais tomados pela ciência ferem
a dignidade humana (o maior laboratório genético humano na
Islândia prenuncia aonde vai levar a decodificação
do genoma humano, que consiste em bilhões de gens e os cientistas
têm a pretensão de quererem descobrir a função
de cada um).
Os artistas abstratos modernos baseados nas revelações
sobre o mundo atômico romperam com a representatividade e buscaram
revelar o divino. Visavam à purificação do artista
e a criação de uma nova escala de valores para plasmar uma
sociedade mais humana. Baha’u’llah passou metade do século
passado na prisão na Pérsia, sofrendo todo tipo de torturas
para lançar os fundamentos de uma nova civilização.
Todos se baseavam em princípios platônicos e socráticos.
Curiosamente Báb, o mensageiro de Deus da fé baha’i desempenha
o mesmo papel de Sócrates em relação a Platão,
no sentido de abrir caminho para a doutrina de Baha’u’llah.
Mas o objetivo aqui é explicitar processos cognitivos atuantes.
O fundador da fé baha’i em condições execráveis
consegue articular uma doutrina onde a mulher é igual ao homem
e a Terra deixa de ser um mero recipiente passivo. Já a história
do Ocidente nos últimos 150 anos pode ser entendida como uma série
de tentativas de preencher o ...vazio deixado pela erosão da teologia
cristã.
Heidegger coloca Rilke [Heid52a] e Nietzche [Heidb] como profetas da
Modernidade. Hitler se baseou em Nietzche e os próprios alemães
concordam que Nietzche teria dificuldade para editar seus livros hoje em
dia pois ferem muitos direitos humanos. Rilke em suas Duineser Elegien
...em1923 aconselha as mães a ensinarem suas filhas a se entregarem
aos heróis para amaciarem suas energias viris e esses a tratá-las
com indiferença para realizar o progresso humano!
O artista abstrato Mondrian teorizava sobre a inferioridade do feminino
e devotou uma defesa detalhada da intrínsica ‘masculinidade’ da
arte abstrata [Chee91:119-129]. O próprio Hitler citava o
seu trabalho para estigmatizá-lo.
Mondrian invocava o seu paradigma de pureza para reivindicar que a
arte estava se liberando de fatores opressivos que encobriam a expressão
pura da vida; o que é verdadeiro emarte também deve ser
135].
A arquitetura inspirada nas idéias desses artistas criou um
ambiente opressivo onde não há lugar para a mulher e a criança
e o resultado foi o estourar dos movimentos feministas da década
de sessenta.
Mondrian invocava os mecanismos de purificação do artista
que excluem elementos como o feminino ou episódios inteiros da história
da arte de um modo obviamente opressor. Opressão objetiva – as dificuldades
impostas por forças externas, ambas econômicas e políticas
– e opressão subjetiva que resulta da ‘visão limitada’só
podem ser superadas através da purificação, um processo
que Mondrian descreve nesse contexto usando metáforas militares
e patriarcais: a arte plástica nos revela que a fim de vencer a
opressão objetiva, elementos e formas existentes devem ser relacionadas
cuidadosamente ou se possível transformadas. Para dominar a opressão
subjetiva, a transformação de nossa mentalidade é
necessária.
Hitler faz um discurso semelhante ao descrver a vocação
da nova arte alemã: promete desencadear uma guerra incansável
de purificação contra os elementos últimos de putrefação
na cultura alemã.
A intenção aqui é revelar o difícil jogo
da consciência revelado através de seus expoentes máximos
e a sua fragilidade. Independente da busca do ser através de tendências
platônicas, aristotélicas ou meramente mentais, pode-se
chegar a certos equívocos.
Sem dúvida a arte abstrata abriu caminho para a tomada de consciência
do Ser e iniciou a época da Modernidade. Igualmente a existência
de Baha’u’llah foi a mola propulsora do desencadear de uma nova civilização
baseada na igualdade entre o homem e a mulher e onde a Terra é a
Gaia de Lovelock. Ocupa o mesmo papel desempenhado pelo apóstolo
Paulo ao implodir a civilização romana ou o de Mozart ao
implodir a aristocracia francesa. É bem conhecida a polêmica
gerada entre Beethoven e Mozart. Beethoven encarna os princípios
da Revolução Francesa e no entanto morreu misantropo.
Essa argumentação evidencia que os mais elevados expoentes
humanos em termos de consciência são impotentes para explicitar
uma escala de valores que sirva em qualquer época e em qualquer
lugar e que exaure todos os aspectos da consciência humana e cósmica.
. O mérito de Baha’u’llah consiste em deixar claro que as doutrinas
são para uma determinada época e um determinado lugar e que
Deus sempre envia mensageiros de acordo com a época e o lugar. Porisso
devemos respeitar todas as religiões.
Não há esfera de consciência mais rica para
mostrar essa diversidade que as próprias tendências da arte
ocidental neste século. A liberdade de que o artista goza faz com
que não haja entraves a sua imaginação e o resultado
é uma exploração das manifestações do
ser das mais liberadoras e enriquecedoras.
II O desdobramento da consciência artística no século XX
De modo grosseiro na pintura da natureza do séculoXIX tardio,
detecta-se três tendências:
1) a representação fiel da aparência visual do
objeto (impressionistas, Cézanne)
2) a revelação e ênfase dos materiais e processo
de pintar,a arte na arte (impressionistas,Cézanne)
3) deformação da realidade para expressar idéias
e sentimentos (van Gogh, Munch, Gauguin, Seurat e Cézanne)
O cubismo de Picasso é o ponto de mudança e funciona
como a cabeça de Janus. Olha para trás na sua análise
da realidade visual e para frente na subjugação da realidade
visual em direção à completa desconsideração
do objeto na pintura não-objetiva.
Ênfase na última, o revolucionário aspecto do cubismo
oclta o primeiro aspecto tradicional do cubismo. Abre as portas para o
abstracionismo de Kandinsky.
Basicamente,a arte deste século segue sete tendências
básicas [BRR99]:
1) Realidade –deformação : Aqui se concentram as pinturas
expressionistas.
2) Abstração- espiritualidade: Em busca do Absoluto,
do divino. A paisagem e o espaço se abstraem enfatizando-se a ordem
geométrica pura e o desenho minimal. Principalmente a escola De
Stijl de Mondrian e van Doesburg revolucionam o design no sentido da planta
livre que tem sua origem em Michelangelo, apontando que a solução
no design se encontra em relações topológicas.
3) Sonho- mitos: Engloba os mundos surrealistas. Magritte abre o discurso
sobre o signo.
4) Arte como objeto: Duchamp introduz seus ready-mades (pá
de escavar, urinol,etc) em1917. Enquanto proclama a posição
anti-arte tradicional que qualquer coisa que o artista diz é arte
é arte,ainda estáenvolvido com a questão da arte.Só
quem sabe que sua pá de escavar é arte, chamá-lá-ia
de arte. Já o manifesto dadaísta glorifica a beleza do cotidiano,
da liberdade, da espontaneidade, da contradição, do absurdo
em suma da vida. Kurt Schwitters traz vida à arte, dissolvendo as
barreiras entre as duas realidades. Mitchell, Rauschenberg e Oldenburg
são os principais representantes. As esculturas gigantescas de tomada
de luz, hamburgers, sorvetes de Oldenburg ficaram conhecidas como arte
das instalações ou esculturas no espaço cotidiano
ao invés de no museu. Jim Dine comenta que suas pinturas fazem
uma declaração sobre a arte do mesmo modo que alguém
fala sobre os carros de Detroit,objetivamente como um outro tipo de coisa.
5) A arte como linguagem: Arte conceitual. No canal informacional de
minha dissertação de Mestrado, o pesquisador encontra material
abundante para se exercitar nessa tendência. Mas novamente aqui o
objeto é retirado da arte.Mel Bochner define arte= idéia
+ objeto. Mel fala que nunca valorizou os objetos emsua arte e vida. O
que o interessava eram as idéias, os tipos de pensamento envolvido
na arte. Não há um contínuo entre mais objeto a menos
objeto. Ou uma coisa é um objeto ou não! Mas quando
iniciou sua carreira no início da década de sessenta, a fórmula
era arte = objeto. Os Johns, Rauschenbergs eram ‘coisas’da formação
do seu pensamento. Tudo neles acentuava a fisicalidade. Gostava muito do
seus trabalhos. Mas eram tão fortes quanto a memória deles.Uma
vez que tinha a idéia do trabalho, ele a possuía [John76].
6) A arte contemporânea: As exposições de arte intituladas Documenta da cidade de Kassel na Alemanha que se realizamdesde 1955 de cinco em cinco anos são consideradas como indicadoras da tendência para onde vai a arte. A última delas Documenta X em 1997 organizada por Catherine David, secretária geral do MAM e do Centro Georges Pompidou e da Galeria Nacional do Jogo de Paume em Paris incluiu a própria cidade além dos lugares de exibições tradicionais tais como o museu Fridericianum ou o Hall da documenta. O visitante tem de percorrer desde a estação ferroviária até as margens do rio Fulda, passando por galerias subterrâneas através do centro da cidade. Misturam ‘obras-de- arte’ da Documenta X com os anúncios comerciais da cidade, de modo que é difícl saber onde começa a arte e onde pára o cotidiano. Posters em passagens subterrâneas mostram edifícios tipo ex-BNH que se encontram no mundo inteiro. Além disso, usa o Jardim Barroco da cidade para exibir um chiqueiro com o objetivo de se pensar a relação com a natureza. Aqui na Documenta X se pode ver vestígios da arte das instalações de outras documentas tais como os ‘carvalhos’de Joseph Beuys = 7000 blocos de granito em frente ao Fridericianum, representando sua intenção de plantar 7000 árvores.
7) A arte do computador [BRR99] [http2,3,4,5,6]: Não há maior desenvolvimento por falta de se aprofundar nos processos da arte exteriorizados como linguagens descritivas. Perguntas pertinentes aqui: É a idéia emsi mesma a coisa mais importante? Ou o ato de criar? Ou sua apresentação? E a arte assume aqui a característica de evento como na artede Pollock. A idéia é as performances ocorreremem diferetnes lugares, com os artistas espalhados pelo mundo inteiro e mostrando todos os tipos de arte conectados pelo computador criando uma performance coletiva, onde as próprias pessoas são a festa ou o evento. A interação é a coisa mais importante. As pessoas são parte do enigma e tem de se envolver. Isso é Stromkunst [http99].
Passo a comentar a obra de pioneiros que diretamente contribui para romper as barreiras entre “thoughtlike” things e “rocklike” things, mostrando que a coisa e o processo são as duas faces da mesma moeda.
II.1 A magia transacional entre “thoughtlike” things e “rocklike” things
Antes de focar a atenção no ensaio de Heidegger sobre
A origem da arte [Heid52a] chamo a atenção do
pesquisador para o fato de que Heidegger a serviço de Hitler não
podia se debruçar sobre a arte moderna desua época considerada
como degenerada pelo ditador nazista. Embora admirasse Rilke
a ponto de saudá-lo como o profeta da modernidade, menosprezava
os seus Novos Poemas caracterizados como poesia-coisa. Curiosamente, Heidegger
escreveu um livro sobre a ‘coisidade’ da coisa [Heid87]. Nem aqui nem no
seu ensaio coloca a coisa como o fazem os “mestres da coisa”. E tão
pouco elucida a questão como o faz Jack Sarfatti em sua nova teoria
pós-quântica sobre a consciência humana.
Essa análise que passo a realizar, para evidenciar processos
semióticos e hermenêuticos revelados por esses pioneiros é
fundamental à natureza da arte e conseqüentemente para se chegar
ao âmago do ser da “thoughlike” thing e da “rocklike” thing.
Só assim se pode refletir a transcendência numa modelagem
imanente. David Bohm fala de uma ordem implicada transformada em
explicada [Lour98], [BP87].
Ou na linguagem mais acessível do poeta alemão Rilke:
Erst denn war ein Ding da, erst denn war es Insel, überall abgelöst
von den Kontinent des Ungewissen [Rilk55:271]. Só assim aparece
a coisa, só assim se torna uma ilha em cada lugar separada do continente
da incerteza.
O meu modelo de ecodesign é uma modelagem imanente baseada
na teoria do signo de Hjelmslev e o modelo de ondas primárias e
secundárias do desenvolvimento biológico de Zeeman
[Lour88]. Aqui a obtenção da coisa arquitetônica por
computador só se faz possível, se se revelar o processo associado
à coisa que deixa transparecer a sua “coisidade”.
II.1.1 Jackson Pollock: a relação entre o “eu” e a natureza
O expressionismo abstrato de Pollock é bem diferente do abstracionismo
de Kandinsky. Hans Hoffman critica Pollock: Você não se inspira
na natureza. Pollock retruca: Eu sou a Natureza.E se apresenta
como o herói existencialista. Já Kandinsky se sentia como
uma marionette nas mãos de Deus e van Doesburg negava toda a
individualidade,voltando suas energias para descobrir e revelar a harmonia
das leis cósmicas [Humb80].
A passagem seguinte explicita o artista como existencialista:
Num certo instante a tela começou a aparecer para os pintores
americanos como uma arena onde atuar…. O que devia ir para a tela não
era uma pintura mas um evento. O pintor não mais se aproximava do
pincel com uma imagem emsua mente; ia até o pincel com material
em sua mão para fazer algo a aquele outro pedaço de material
em sua frente. A imagem seria o resultado deste encontro…não
há ato se você já sabe o que contém… A pintura-ato
ou pintura-ação é a mesma substância metafísica
que a existência do artista. A nova pintura quebrou a distinção
entre a arte e a vida. A arte como ação repousa na premissa
de que o artista aceita como real apenas aquilo que está no procdesso
da criação…o ato na tela é uma extensão do
esforço total do artista para extravasar sua experiência…a
tensão dialética de um ato genuíno, associado como
um risco e arbítrio.[John76]
A liberdade que Pollock abraçava era um grande fardo para ele
como para o advogado de Camus que descobriu:
É um núcleo… e uma corrida de longa distância,
solitária e exaustiva. Nenhuma champagne, nem amigos elevando seus
copos, enquanto olham você afetuosamente. Sozinho numa sala proibida,
sozinho na cadeira do réu… diante dos juízes e sozinho para
decidir em face de si mesmo ou em face do julgamento de outros. No
final de toda a liberdade há uma sentença de juízo;
por isso a liberdade é tão difícil de portar.[John76]
Pollock buscou a natureza do eu na natureza da pintura. Acusada de
ser mero modismo na época em que foi criada, diziam que qualquer
criança faria o mesmo ao brincar com pincéis e uma tela sentada
no chão,a arte de Pollock provocou filas enormes no MAM de Nova
York e na Tate Gallery de Londres, que exibiram uma grande retrospectiva
de sua carreira. Até mesmo os cientistas se dispuseram a descobrir
as causas inabaláveis de seu sucesso. Submeteram suas telas complexas
a análises matemáticas. Chegaram a algumas conclusões
surpreendentes. Por trás do aparente caos, o universo de Pollock
tem um ritmo que segue a mesma teoria dos fractais seguida pela natureza.
São variações ordenadas e até mesmo padronizadas
que encontram um eco imediato embora inconsciente no olhar humano.
Pollock certamente atingiria a consciência supramental
ao saber disso e cessaria sua angústia existencial que o levou
à morte prematura [Poll00].
II.1.2 Robert Rauschenberg e a arte-coisa
Já Robert Rauschenberg quebrou os padrões do expressionismo
abstrato de Pollock que dominava os salões de arte até os
anos 60, estimulando a participação e análise do público
através de uma arte feita comcoisas que garimpava nas ruas de Nova
York. Recolhia roupas, tecidos, utensílios, pneus, latas de lixo,
revistas em quadrinho, caixas de papelão e até mesmo animais
empalhados. Dizia que qualquer coisa podia ser uma obra-de-arte, desde
que tratada com inteligência e sensibilidade [Raus00].
O Bhagavad-Gîta as it is revela que umapessoa se auto-realiza
ese chama um yogue (ou místico), quando está completamente
satisfeita com a aquisição do conhecimento e sua realização.
Tal pessoa situada na transcendência se auto-controla. Vê
tudo como igual – independente de se tratar de seixos, rochas ou ouro!
Igualmente o grande místico Sri Aurobindo que uniu as concepções
do Oriente e do Ocidente e é considerado o verdadeiro libertador
da Índia, sendo Gandhi um mero filho espiritual seu confessa
que o período decisivo de seu desenvolvimento intelectual sobreveio,
quando pode ver claramente que o que o intelecto dizia era às vezes
exato e às vezes não exato, que o que o intelecto justificava
era verdadeiro e que o contrário também o era.Não
admitia nenhuma verdade no mental, sem admitir simultaneamente seu contrário.
Resultado, o prestígio do intelecto sumiu...[Sapt70].
É óbvio que Rauschenberg habita tais camadas transcendentes,
conseguindo expandir os limites da arte com seu processo de criação
e suas idéias. Encarna bem o desprezo dos yogues pela arte
decorativa ocidental. Chegou a inventar a arte performática. Tão
zen-budista! Exemplificando, a pessoa se instalava dentro de dois
pneus colocados em pé um paralelo ao outro. Aí rolava
como um pneu...se reificando em pneu!
Ou então colocava rodas numa cama, retiravam o colchão
e o artista performático se movimentava de pé através
da sala enfiado nela! Ou então imitava uma lagarta deitado
numa prancha com rodas e se movimentava através do apoio dos braços
no chão.
Sri Aurobindo fala que para se atingir a consciência supramental
basta silenciar o mental. É óbvio que os exercícios
da arte performática visavam esse objetivo. Uma vez transposta essa
barreira, a seguinte estrofe de Fernando Pessoa da poesia Guardador
de Rebanhos se realiza:
O essencial é saber ver
Saber ver sem estar a pensar
Saber ver quando se vê
Nem vê, quando se pensa.
Um crítico perguntou a Rauschenberg como começava uma
obra. Respondeu que dentro dele tinha um cara chamado Rauschenberg.
Ia ao estúdio, começava a andar e olhar as coisas. Aí
eu o ajudava a montar algo. Ou a litogravura Acidente se intitula assim,
porque a impressora quebrou a pedra, enquanto ele passava tinta. É
assim que ele trabalha. Aproveita o que acontece e aplica. Ganhou um prêmio
e elevou as litogravuras a uma grande forma de arte. Antes eram feitas
em papel. Depois dele,eram feitas de alumínio, espelho,
tecido ou papelão. Trabalha na lacuna entre a arte e a vida.
Embora suas gravuras pareçam simples e que qualquer um as faria
são incrivelmente complicadas e comum impacto visual profundo devido
à maneira como joga com as cores eo modo cuidadoso como coloca as
coisas. Não escolhe nada aleatoriamente. Escolhe
especificamente o uso de imagens, formas e cores. É um desafio.
Não é uma obra para se olhar passivamente. É preciso
reagir de algum modo e alguns reagem horrorizados ou enojados. Rejeitam
completamente. Como se pode chamar de pintura roupas velhas ao acaso penduradas
na parede do museu? Não se fica passivo. Alguma reação
desencadeia,pois nos envolvemos com sua obra totalmente.
Rauschenberg quer que a arte crie um novo modo de ver e com um novo
modo de ver , espera que haja um estímulo para se pensar de modo
novo. Leibniz já negava a importância dos sentidos e
até mesmo a arte e esperava obter também um novo modo de
pensar. Há muita relação entre a filosofia do infinito
de Leibniz e a obra do artista gráfico Maurits C. Escher analisada
na secção
Os artistas também podem contribuir no modo como apóiam
as causas sociais e políticas. Tenho consciência de que não
só o artista pode influir na transformação sócio-político-econômica
como qualquer pessoa consciente disposta a mudar o status quo. Acredita
que os artistas podem ser um fator importante na mudança de atitudes
arraigadas. Hoje em dia quando o princípio da cidadania se torna
realidade, qualquer cidadão muda atitudes arraigadas. Benedita da
Silva nasceu em favela e hoje é vice-governadora do Rio de
Janeiro além de senadora e candidata a prefeita.
Mostrou suas exposições até na ex-URSS e Cuba.
Sua arte não conhece fronteiras. Seu precursor Duchamp dizia
que o artista tem 50% da responsabilidade ao mostrar o trabalho.Mas a outra
só se completa com a reação retornada do espectador,
transformada pela experiência. E é isso que faz da comunicação
em artes visuais uma outra lingaugem e algo em que há sintaxe e
vocabulário pictóricos e todas as coisas que associamos com
a escrita.
Rauschenberg põe o mundo em seus quadros. Por ocasião
de sua exibição no Jewish Museum no início de sua
carreira, os seus combinados (combines = escultura + pintura) com galinhas
empalhadas ecaixas e tiras de jornal, pedaços de revistas provocaram
o furor dos críticos. Estaria fazendo pouco caso da arte.
Um escândalo. Monograma causou controvérsia. Um
insulto matar uma cabra. Mas Rauschenberg apenas resgatou uma cabra
empalhada numa loja de móveis usados. Depois a lavou, penteou
e desfez os nós de sua pelagem, pôs um pneu em sua volta,
encheu de tinta o focinho e a instalou em um jardim: uma colagem
feita a partir de materiais encontrados na rua. Fala que é uma alusão
à agricultura e à pecuária.
Seus quadros podem ter a rainha da Inglaterra, um hidrante um ao lado
do outro. Quer dizer que não sabe distinguir entre eles? Não!
Explica seu filho Christopher Rauschenberg. Seu pai é divorciado.
Significa que o mundo tem coisas cuja importância vemos e coisas
importantes e bonitas que não reconhecemos. Talvez só queremos
perceber a Rainha, mas há quem ande por aí e só perceba
o hidrante. Se prestar atenção ao que está acontecendo
e procurar coisas belas ao ir a um museu, verá mais beleza no caminho
do que lá dentro.
Rauschenberg diz: Não tenho nada em que pensar, enquanto trabalho
a não ser deixar minha mente vagar. Conheço o meu trabalho.E
tecnicamente escolhi este modo de trabalho em que tenho o máximo
de falta de controle. Para que ocorra algo em que não pensei.
Você está numa situação que é séria.
Há aqueles que querem alguns centímetros a mais para a frente
ou para trás de modo que o trabalho fique abordável, mas
fora de alcance.
Como artista é preciso continuar sempre avançando.
Seu trabalho como artista é ser explorador e ir a algum lugar onde
ninguém jamais esteve. Seu trabalho como artista não é
fazer um trabalho comum.
Vasculhava as revistas atrás de fotos de fatos atuais que combinava
com ícones da história da arte e suas próprias fotografias.
Mandou produzir silkscreens com essas imagens que aplicava com rolo em
seus enormes quadros, recobrindo tudo com exuberantes pinceladas
impressionistas à distância. Freqüentemente eram vistos
como abstrações. Se não se está acostumado
a sua estéticas e visões,a sua arte é difícil
de classificar. Parece uma mixórdia de coisas. Olhando
a fotografia só se vêem os blocos de prédios.
Se não se está acostumado às imagens pode ser confuso.
Mas se se está e olhá-lhas individualmente veráporque
estão reunidas ou como se relacionam e interagem. Pode-se
entender a conversa entre as imagens que têm lugar numa visão
mais complexa. Diz-se que usa objetos e imagens para falar de nós
mesmos. Quando se vê um trabalho de Bob é como
girar em volta da Terra num rápido piscar de olhos. Vê-se
o que acontece na Terra. Bob nos dá idéia do que é
o desdobramento da humanidade.
No contexto de desenvolvimento sustentável, o ideal de sistemas
bio-integrados imitando a natureza onde a emissão de poluição
tende a zero devido ao reaproveitamento dos resíduos de um sistema
pelo outro é genialmente expressa em Monograma. E causou furor!
E a questão é: quem é louco? Quem é
capaz de viver com 25 centavos por dia para comer, apenas poder andar a
pé, pagar 25 dólares de aluguel e se contentar com pão
de cebola velho de três dias mais manteiga de amendoim para poder
chegar a apresentar o Monograma acima em museu ou quemaceita o mundo desenvolvimentista
e que gasta ¾ dos recursos e energia da Mãe Terra tendendo
a transformá-la num gigantesco depósito de lixo a céu
aberto? Isso justifica a necessidade de se criar estações
espaciais na busca por mais espaços. A mentalidade colonialista
não é abandonada nunca...E é pena que de fato um meteorito
não caia bem em cima desses indivíduos...Assim pensam que
não precisariam se preocupar com mais nada...
O que fez Rauschenberg agüentar essa situação eu
não sei, mas o fato de estar vivendo com apenas um salário
mínimo enviado por meu ex-marido, enquanto aguardava a transição
para o pós-doutorado e me recusar a dar aulas na FAU ou na Unicamp
de desenho técnico, AutoCad e etc não seria possível
sem uma visão global das coisas. Assim vi como previ
o despencar dos salários para metade em termos da única moeda
que conta que é o dólar. Os recentes protestos na França
dos insuportáveis preços do petróleo e a ameaça
da volta da inflação... Isso é uma guerra e como mostram
os psicólogos, o índice de suicídio numa guerra é
muito baixo...Mas o que faz com que eu me satisfaça com essa visão
de mudança dos valores, enquanto todos voltam seus esforços
desesperados para continuar com a velha ordem mundial?
Gadamer confessa que nada é tão aterrador como o exercício
de capacidades geniais para o mal. Evidentemente todo esse ensaio
visa jogar luz sobre o fenômeno da arte. Está se tornando
evidente que ser artista por si só não significa ser
capaz de expressar a verdade, o bem e o belo em plenitude à imagem
e semelhança de Deus. Mas não se pode negar que a arte neste
século como um todo parece imbuída de atingir esse ideal.
Fica também evidente que os processos cognitivos ligados à
criatividade não se revelam apáticos à reflexão
ética. Aristóteles apresenta a penetraçãoe
a tolerância. Tem boa penetração de espírito
aquele que julga reta e eqüitativamente. A pessoa que
possui boa penetração de espírito está disposta
a reconhecer o direito da situação concreta do outro. Porisso
se inclina em geral também à compaixão e ao perdão.
Porisso o homem compreensivo não sabe nem julga a partir de um simples
estar postado frente ao outro de modo que não é afetado,
mas a partir de uma pertença específica que o une com o outro,
de modo que é afetado por ele e pensa com ele [Gada ].
Na revista Psychologie Heute de abril de 2000, os cientistas mostram
que os processos cognitivos para se saber se algo está certo são
os mesmos envolvidos em fazer a coisa certa. Porisso que a pessoa burra
não consegue perceber, quando alguém realiza uma tarefa melhor
do que ela.
O conselho a seguir para que grandes massas tenham acesso à
arte é o desenvolver da humildade. A humildade como insiste Tagore
é um estado. Ou se é ou não se é humilde. Ou
se percebe que o astro rei, o Sol, é o que ele é porque as
enzimas oxigenadoras da lama produzem oxigênio em tal quantidade,
permitindo o fenômeno da luz ou não se percebe. O sol percebe
e agradece às enzimas por seu esplendor visto da Terra. Será
que as enzimas são humildes?
O poeta Rilke certamente nos auxilia a quebrar o ego e entrar nesse
doce estado da humildade.
II.1.3 Rilke: Kunstwerk x Kunstdinge (obra-de-arte x coisa-da-arte)
A seguir continuo tentando mostrar através de Rilke quão
complementares são todos os aspectos envolvidos no objetivar da
experiência. O escopo da ciência é objetivar a experiência
até que fique livre de qualquer momento histórico. Num e
noutro caso a objetividade ficaria garantida pelo fato de que as experiências
que jazem ali poderiam ser repetidas por qualquer pessoa.Ou no caso das
ciências do espírito o procedimento completo tem de ser passível
de controle. Faz parte do contexto da experiência no entanto a sua
eterna abertura à verdade. E a verdade é infinita e
desabrocha em míriade de aspectos tal como as pétalas da
flor do lótus cujo núcleo parece ser uma fonte inexaurível
de pétalas por abrir.
É óbvio que sem essa objetivação da experiência,
o captar dos aspectos transcendentes que deverão se introjetar na
coisa enquanto aspectos puramente imanentes portanto objetivos faz com
que a modelagem não seja possível.Ou não se
chega a nenhum consenso. Rodin em suas discussões com Rilke
fez com que percebesse essa mudança radical no modo de pensar e
agir. E se não entro diretamente na magia do mundo de Rilke é
porque estou preparando o caminho para que o pesquisador não fique
ofuscado pela luz de Rilke e continue nas trevas.
O comentário a seguir de Duchamp revela um pensar fragmentário
que o impede de se identificar à situação. Escreve
a Hans Richter em 1962: Esse Neo-dada que chamam de novo Realismo,
Art Pop, colagem, etc é um jeito fácil e se alimenta do que
o Dadaísmo fez. Quando descobri os ready mades, pensei desencorajar
a estética. Esse Neo-Dada tomaram meus ready-mades e
encontraram beleza estética neles. Joguei o urinol e o cabide de
pendurar garrafas em suas faces como desafio e agora os admiram por sua
beleza estética.
Através desse comentário se percebe que Duchamp
continuou vivendo no nível 2 da mente e que os artistas incorporaram
o seu desafio, apesar de que ele não percebeu isso.Infelizmente
não há tempo aqui para relatar os vários tipos de
arte, passando pela arte minimalista, ótica, cinética, ambiental
e conceitual que mergulhando na coisa acabaram por transcender a sua materialidade
e penetraram nos doces mistérios dos processos dinâmicos
imanentes a ela associados.
Espero que fique claro ao pesquisador da forma como os artistas rompem
com as barreiras entre os níveis 1, 2 e 3 da consciência descritos
na mecânica pós-quântica. O desdobrar dessa visão
holística revela um leque de dimensões conceituais,
a saber, o artista, a obra-de-arte, o produto, a coisa, o processo, a máquina,
o artesanato (know-how), etc como partindo de uma origem comum.
Trata-se aqui de descobrir e revelar uma concepção tão
abstrata e abrangente quanto a de Leibniz na Monadologia na querela sobre
a continuidade:
A divisão do contínuo não deve ser considerada
como a da areia em grãos,mas como a de uma folha de papel
ou de uma túnica em dobras, de tal modo que possa ter aí
uma infinidade de dobras, umas menorres que as outras sem que o corpo se
dissolva jamais em pontos ou minima [BC93:56].
Mais ainda Leibniz coloca corajosamente que não se trata apenas
da separação entre dois domínios (o finito, o objeto
de experiência e o infinito, realidade transcendente), mas também
entre dois tipos de inteligibilidade:
Ainda que sejamos seres finitos, podemos saber muitas coisas sobre
o infinito, por exemplo sobre as linhas assintóticas, isto é,
aquelas que prolongadas ao infinito se aproximam cada vez mais sem jamais
coincidir; sobre os espaços cujo comprimento é infinito
e cuja superfície não ultrapassa a de um espaço finito
dado, sobre a soma de séries infinitas.[BC93:49] De outro modo não
teríamos nenhum conhecimento certo de Deus. E uma coisa é
conhecer a propriedade de um objeto, outra coisa é compreendê-lo,
isto é, possuir todo o seu conteúdo escondido.
Percebe-se aqui como essa colocação de Leibniz é
feliz e cria uma ponte entre os dois domínios e os dois tipos de
inteligibilidade. E assim descarta os paradoxos, mostrando que quando esses
aparecem adquirem uma função de laboratório conceitual.
As dificuldades surgem de princípios mal fundados (há um
ponto na extremidade de uma linha) que desempenham o papel como tantos
outros pressupostos no raciocínio de uma mistura de gêneros
sobre o qual não se tem domínio: raciocina-se sobre a linha
como se fosse composta por pontos, sobre a superfície como se fosse
composta de linhas. Não misturar os gêneros, esta é
a regra principal, se se quiser ter uma chance de resolver e mesmo dissolver
os paradoxos. Eis aqui a precisão e a amplitude de visão
de um matemático e metafísico, demonstrando que não
há a menor incompatibilidade entre religião e ciência.
Pelo contrário, o irromper em vários domínios nos
aproxima dos segredos da criação [BC93:54].
Para o artista gráfico Escher, a preocupação com
o infinito é toda a sua vida. Mas o aborda do ponto de vista meramente
geométrico e acaba revelando toda uma consciência geométrica
baseada nos grupos de simetria do plano e do plano sem ponto. Os grupos
de simetria de similaridade e de simetria conforme são fractais.
Assim não interessa chegar a um consenso necessariamente. Interessa
é despertar os nossos potenciais para desvendarmos meios mais eficientes
para se revelar a verdade. E a arte de obra dá esse recado,
gerando menos atrito na comunicação do que a filosofia com
certeza. Ou se entende uma obra de arte ou não se entende, mas ninguém
nega a beleza da obra de Escher. O Michel Spira no IMPA em 1996 por
ocasião da Escola de Álgebra quis impor sua autoridade de
matemático à minha percepção sem entraves e
afirmou categórico que estava enganada. As imagens de Escher não
passavam de mera fantasia e não tinham nada a ver com fractais.
Hoje essas fantasias estão classificadas matematicamente em minha
tese de doutorado. De fato não tenho formação acadêmica
em matemática mas se a tivesse eu tenho certeza que meu lado artístico
me impediria de fazer afirmações semelhantes que revelam
um espírito nada científico e portanto bem longe da justiça.
Certamente poderá haver censura por parte da FAPESP o fato de
eu não ter papas na língua, mas o que dizer da recente manifestação
artística na Alemanha em que os artistas saíram às
ruas com máquinas de lavar roupa numa demonstração
de se exigir transparência e pureza na política? Ao relatar
ao Mário Covas o jeito que certos professores da UFRJ e da USP me
tratam concluiu que era caso de se instalar uma CPI!!
Então lavemos roupa suja em casa que é bem mais saudável
e veremos que produz milagres a nível político, social e
econômico pois elimina entraves à introdução
de aproximações que tem profundo impacto na qualidade de
vida humana.
Agora acredito que o terreno já está bem preparado para
entrarmos numa relação de desconstrução do
ensaio de Heidegger, coisa que nem o filósofo deconstrutivista Jacques
Derrida se aventurou.
No curso da História da Verdade sobre o sujeito do ser, as três
maneiras de definir o ser-coisa compreendem a coisa como:
1) suporte de qualidades marcantes
2) unidade de uma multiplicidade de sensações
3) matéria informe.
Estas interpretações se combinaram. Essas combinações
reforçaram sua extensão de modo a ser válida para
a coisa, o produto e a obra-de-arte. E assim se formou a maneira predominante
de conceber não apenas as coisas, os produtos e as obras mas todo
o ser (étant, being) em geral na filosofia.
Antecipa toda a apreensão imediata do ser. Liga todo o esforço
para meditar o ser de cada gênero em seu desdobramento (étant).
Na filosofia, os conceitos de coisa reinantes nos impedem o acesso
ao caráter de coisa das coisas, bem como o caráter de produto
do produto, sem falar do caráter obra-de-arte da obra-de-arte afirma
Heidegger [Heid52c].
A introdução acima de como ocorreu o desdobramento da
consciência artística deste século reflete essa problemática,
incentivando a total subversão de categorias rígidas. Na
nova ciência da computação essa indefinição
se torna ainda mais problemática ao se tentar modelar artefatos
(produtos) e processos de software através do paradigma orientado
a objetos. Cria-se aqui um mal-estar por não se ter competência
para se entender os sistemas computacionais abertos que estão sendo
elaborados tais como os de Patrick Stey
capazes de modelar qualquer gênero do desdobramento do
ser. O próprio sistema computacional aberto é uma coisa ou
é um processo?
Felizmente o poeta Rilke parece jogar luz nessa controvérsia.
O mesmo diria da mecânica pós-quântica de Sarfatti.
Para Rilke [Maso64], uma concepção quase mística
das ‘coisas’ lhe foi muito importante desde cedo. Desde 1899, o Deus do
Livro das Horas foi tratado por Du, Ding der Dinge (Tu, Coisa das Coisas).
Desde 1902, Rilke tendeu a relacionar esse conceito da coisa também
com as atividades dos artistas. Assim falava de preferência
de Kunstding em vem de Kunstwerk. Kunst significa arte em alemão.
Em vez de obra-de-arte falava de coisa-da-arte.
No livro sobre o famoso escultor moderno Auguste Rodin [Rilk
], Rilke elogiou a escultura que em sua demanda pela ‘coisidade’simples
(Dingwerdung, thingness) realizava desejos e receios.
Rilke colocava ao lado da já discutida transformação
de todo o ‘exterior’em interioridade (Innerlichkeit) um outro, não
menos importante, mas processo contrário através do qual
a ‘interioridade’ por intermédioda ARTE se transformava em
‘exterior’, em coisa (Dinge).
Ambos esses processos se complementam reciprocamente e devem sersempre
vistos juntos.
Nos Novos Poemas publicados em 1907 e 1908 em duas séries,
Rilke se torna um pintor ou escultor da natureza. O poeta terno, mimoso
da interioridade se torna monumental. Influenciados pelo convívio
com o escultor Rodin e pela descoberta da pintura de Cézanne, estes
poemas representamummarco divisórioemsua obra e não deixamdeinterferir
na poesia existencial dos últimos anos e até mesmoemvários
dos Sonetos a Orfeu. Neles ocorre a convesão de Rilke ao objetivo
e ao concreto, sua passagem do mundo dos estados de alma, sentimentos e
impressões ao mundo das coisas [Camp94].
A propósito dos novos poemas, Angelloz fala de uma concepção
poética naqual o sujeito se deixa absorver pelo objeto e lembra
aindaa expressão cunhada por Oscar Walzel, Entichung der Lyrik (desegoização
da lírica) para designar esse lirismo novo de onde o Eu é
ausente, onde ich (eu) é substituído pelo er (ele) [Ange52].
Assim os Novos Poemas nasceramde sua experiência emParis Kunstdinge
(coisas da arte).
Até Heidegger condenou essa parte que pareceria a menos rilkeana
aos apegados ao poeta inspirado. É no entanto Rilke estimado por
João Cabral de Mello Neto,o engenheirode nossa poesia comosepode
ler na composição Rilke nos Novos Poemas de Museu de Tudo:
Preferir a pantera ao anjo,
Condensar o vago em preciso:
Nesse livro se inconfessou:
Ainda se disse, mas sem vício.
Nele, dizendo-se de viés,
Disse-se sempre,porémlimpo;
Incapaz de não se gozar
Disse-se, mas sem onanismo.
Der Panther (A pantera), encarna prototipicamente essa poesia-coisa.
Foi elaborada após Rodin ter lhe advertido de que ele não
sabia olhar. De fato, Cézanne que também o influenciou nessanova
tendência se posicionava: Há duas coisas no pintor: o olho
e o cérebro. Os dois devem cooperar; deve-se trabalhar para o desenvolvimento
de ambos, mas como um pintor: do olho através do ver a natureza,
do cérebro através da lógica de sensações
organizadas que providenciamo meio de expressão. E mais ainda:
Não se é nem muito escrupuloso,nem demasiadamente sincero
nem muito submisso à natureza; mas se é mais ou menos mestre
do próprio modelo e, acima de tudo, do meio de expressão.
Vá ao coração do que está diante de você
e continye a se expressar tão logicamente quanto possível.[John76].
Visão, idéia, criatividade, sentimentos estão entrelaçados.
Eis a linda poesia-coisa A Pantera
De tanto olhar as grades seu olhar
Esmoreceu e nada mais aferra.
Como se houvesse só grades na Terra.
Grades, apenas grades para olhar.
A onda andante e flexível do seu vulto
Em círculos concêntricos decresce,
Dança de força emtorno a um ponto oculto
No qual um grande impulso se arrefece
‘De vez em quando o fecho da pupila
se abre em silêncio; Uma imagem, então,
na tensa paz dos músculos se instila
para morrer no coração
Der Panther
(Im Jardin des Plantes,Paris)
Sein Blick ist vom Vorübergehen der Stäbe
So müde geworden, dass enrich mehr halt.
Ihn ist, als ob es tausend Stäbe gäbe
Und hinter tausend Stäbe keine Welt.
Der weiche Gang geschmeidig starker Schritte,
Der sich im allerkleinsten Kreise dreht,
Ist nie ein Tanz im kraft um eine Mitte,
Ín der betäubt ein grosser Wille steht.
Nur manchmal schiebt der Vorhang der Pupille
Sich lautlos auf – Dann geht ein Bild hinein,
Geht durch der Glieder angespannte Stille
Und hört im Herzen auf zu sein.
Não escreveu esses versos diretamente. Primeiro escreveu um esboço
emprosa, em que uma leoa ia e vinha ao redor de um leão moribundo.
Essa prosa já continha os elementos essenciais da poesia definitiva,
mas não com a concisão aí expressa [Maso64].
Imitando Guimarães Rosa (eu oncei) , diz-se que Rilke
se pantera. Introscreve-se nos seus modelos. Faz com que o eu desapareça
para que, através da captação da figuralidade essencial
do outro, com um mínimo de adjetivação em máximo
de concretude aflore uma dramaticidade imanente, insuspeitada sob o olho
sensível e a pena justa de Rilke, o inanimado se anima e o animado
se humaniza.
Escreve a Lou Andreas Salomé que foi noiva de Nietzche, amante
de Rilke e a amiga mais íntima de Freud: No mundo, a coisa
é determinada, na arte ela o deve ser mais ainda: subtraída
a todo o acidente,libertada de toda penumbra, arrebatada ao tempo e entregue
ao espaço, ela se torna permanência, ela atingea eternidade.
Uma aparece; a outra é; ela ultrapassa indizivelmente seu modelo,
ela constitui a lenta e progressiva realização do querer
ser, que se desprende de toda a natureza. A arte não é, então,
como sepensa, a mais caprichosa e a mais vã das indústrias,
mas um humilde mister, regido por leis rigorosas. E mais adiante:
Quero viver como se meu tempo fosse limitado. Quero me recolher, me
retirar das ocupações efêmeras. Mas ouço vozes,vozes
benevolentes, passos que se aproximam e minhas portas se abrem. As
pessoas que me procuram não podem me ajudar: elas não compreendem.
O mesmo se passa comos livros: demasiado humanos ainda.... As coisas, só
elas, me falam. As coisas de Rodin,as das catedrais, as da antigüidade.
Todas as coisas que são perfeitas. Elas me apontaram os meus modelos:
um mundo de movimento e de vida, na pura simplicidade de seu desígnio,
que é o de deixar nascer as coisas [Camp94].
Obviamente Rilke critica o mundo mental e valoriza a fisicalidade das
coisas comomais inteligível. Corrobora as visões de Sri Aurobindo,
Pollock e Rauschenberg.A Morte do Poeta e o Poeta em Neue Gedichte (Novos
Poemas) registram a tensão de Rilke em busca dessa almejada introjeção
nas coisas e do seu correspondente desgarramento do mundo subjetivo, alegorizados
pela identificação com a natureza.
Dentre os derradeirso poemas Die Frucht O Fruto de fevereiro de 1924
identifica a perseverança em Rilke do desejo de dizer as coisas
que poderiam servir de modelo de Dinggdichte (poesia-coisa) tal o
radicalismo de sua despersonalização e objetividade.
A disciplina e o rigor a que Rilke submeteu as forças tumultuárias
do seu transe poético para transformar a angústia em coisa
constituem uma peripécia exemplar [Camp94:15-16].
Esse delírio representado pelo conhecimento do domínio
em todas as áreas de atuação humana tem de ser domado
e transformado em modelo dependente do domínio tal qual o esforço
realizado em [Lour88] e [Lour98]. Isso demanda alta densidade vocabular,
precisão e concisão, o rompimento de barreiras entre o nível
semiótico da coisa, do fenômeno e o nível hermenêutico
do ser inteligente.
Para quem tem dúvida da adequação de minha aproximação
é só comparar a concisão do meu modelo de ecodesign
com A linguagem de padrões de Alexander, matemático
e arquiteto. Mais ainda enquanto Alexander não desenvolveu o correspondente
modelo geométrico da sua linguagem e por isso mesmo fracassou em
sua implementação , eu apresento um modelo geométrico
robusto que simula a liberdade e a criatividade implicadas no ato do design.
E o modelo computacional imita a sua natureza hermenêutica e autopoiética.
Embora A linguagem de padrões tenha inspirado The design
patterns de Erich Gama et al e também pertença à computação
hermenêutica, é igualmente prolixo. Enquanto a molécula
de ADN exibe apenas quatro bases, as descrições humanas dela
ultrapassam facilmente as mil páginas.
O segredo do meu sucesso consiste na minha capacidade de imitar a natureza
da poesia que é essencialmente concisa e captar a natureza
dupla da luz que se introjeta na problemática coisa-ser, a ponto
de elaborar modelos de aspectos transcendentes e imanentes.
O livro de Rilke sobre o escultor moderno Auguste Rodin bem como qualquer
coisa que escreve sobre o processo de criação deixa transparecer
que o caráter do artista se reflete na modelização:
O trabalho de artesanato nasce,mas parece ser um trabalho para a eternidade,
tão amplo, sem início nem fim e concebido para estar sempre
aprendendo. A paciência estava lá – não se permitia
nenhum salto, sempre a dura obstinada vontade do Poder-do-fazer (Machen-Könnens)
[Rilk55:271].
Mas o caminho não surgiria se o amor não interviesse
: o amor a todos esses ideais, desde o mais baixo até o mais estreito,
- esse grande amor clarividente pela natureza, que só se desenvolve
nos esforçados, que nasce do trabalho como o calor na forja.
Assim tudo se tornou saber a ponto de se incorporar em seu trabalho.
Concreta e arrebatadora sabedoria. Não se deixou inebriar pelos
aspectos fáceis das coisas, mas a chamou a si e as portou até
sentir sua carga transformada em trabalho artesanal – sempre nesse “Um”.
Sob seu peso ficou claro, que no caso das KunstDingen ( coisas da arte)
não é possível efetuar nada através da aparência:
ao contrário, trata-se de gut gemacht zu sein (fazer bem feito).
Dieses Gut-Machen (fazer as coisas), esse trabalhar com o mais puro
saber: isso era tudo.
Plasmar uma coisa – significa: ir a cada lugar, - nada ocultar, deixar
desapercebido, nada fraudar; todas as centenas de perfis conhecer,
todas vistas interiores e exteriores – cada entrelaçamento.
Erst denn war ein Ding da, erst dann war es Insel, überall abgelöst
von dem Kontinent des Ungewissen.
Só então surge a coisa, só então ela é
ilha, separada em cada lugar do continente da incerteza.
Esse trabalho da modelagem é igual em tudo o que o homem faz,
e deve ser feito humilde, delicado, submisso, abandonado, sem escolha de
rosto, mão ou corpo, demodo que a menor censura não mais
esteja presente, de modo que se forme sem saber o que brotar espontaneamente,
como a minhoca uq cava seu caminho no escuro de lugar a lugar. Quando um
rosto não é resultado de um preconceito, uma limitação
da gigantesca imensidão da forma, o rosto é a expressão
de relações mutantes inesgotáveis. O criador não
temo direito de escolher, silencioso e aquiescente deve ser seu trabalho,
hermético também em toda a confiança a forma se entra
e se modela em seus dedos, para pura e revigorada impregnar seu trabalho.
E numa verdadeira atitude zen-budista, a identificação
com a coisa é tal que: Não havia uma luz sequer que se movimentasse
como ele queria, era a luz daquela coisa que lhe pertencia, como
se irradiasse a partir dele [Rilke55:271-272].
Antes de abordar Heidegger, vou expor em traços gerais
a teoria pós-quântica de Sarfatti pois essa apreende melhor
a relação entre “thoughtlike” things e “rocklike” things.
Joga luz numa discussão sobre a coisa e o ser da coisa de um modo
imprevisto pelo primeiro.
II.1.4 Jack Sarfatti: thoughtlike things versus rocklike things
Acredito que Heidegger emseu ensaio A origem da obra de arte [Heid52c]
e no livro Die Frage nach dem Ding [Heid87] (A questão da coisa)
ao invés de ou se basear em conhecimentos científicos
ou estar mais atento ao modo de ser da arte permanece profundamente arraigado
à tradição filosófica e acaba perdendo o fio
condutor do pensamento que o levaria a uma visão mais balanceada
entre o ser e sua manifestação imanente como coisa, produto
ou obra-de-arte. Citando Bachelard, perdeu assim a visão que se
tem ao entrar num mundo em miniatura onde imediatamente as imagens começam
a surgir, então cresceme escapam. O grande surge do pequeno,não
atravésda lei lógica da dialética dos contrários,
mas graças à liberação das obrigações
das dimensões, uma liberação que é uma característica
especialda atividade da imaginação. Essa latitude psíquica
elacionadaao tipo de liberdade interior do que é “local”, onde as
fronteiras se abrem à imaginação sem exigir
que se esteja compulsoriamente se movendo, oferencendo dimensões
de uma viagem ao exaustivo presente e a imagens persistentes com profundezas
ilimitadas de ruminação.
Mas felizmente a mecânica quântica de Sarfatti parece exercer
o papel dos tanmatras da teoria Pinda-Brahmanda, de modo que a circularidade
inerente ao Absoluto que se transmuta em coisas e portanto aí jaz
adjacente se recupera.
Como explica Bohm, o aspecto essencial dessa ordem mecanística
fragmentária “explicate” é que o mundo é visto como
constituído por entidades (coisas) que estão fora de cada
uma,no sentidoque existem independentemente em diferentes regiões
do espaço e tempo e interagem através de forças que
não causam mudanças em suas naturezas essenciais. Esta ilusão
de fragmentação é catastrófica e responsável
pelo status quo atual do mundo socio-político-econômico-cultural
(educacional) e acaba impedindo de se analisar até os aspectos imanentes
da coisa. A linguagem de padrões de Alexander está
mais para uma ordem explicada que implicada. Já o meu modelo
emerge de acordo com uma ordem implicada.
Na mecânica quântica o princípio de incerteza de
Heisenberg é devido à influência inevitável
do observador nas partículas nucleares. Em sistemas ecológicos
e humanos é causada pela enorme complexidade e variabilidade.
Cada dia mais vem se percebendo que esse princípio se introjeta
em qualquer sistema. Mas para se percebê-lo é necessário
se olhar as coisas a partir de uma ordem implicada. A ordem explicada impede
essa visão.
A idéia de Bohr da realidade quântica é fundamentalmente
thoughtlike, mas colapsa para coisas rocklike . De Broglie mostrou
o que Planck descobriu para a luz também era válido para
a matéria. Essa é a dualidade onda-partícula.Planck
e Einstein mostraram que a luz ondulatória clássica tinha
propriedades de partículas quânticas. De Broglie então
mostrou que as partículas clássicas tinham propriedades
de ondas quânticas. A versão de Bohm da realidade quântica
mostra que esta tem propriedades thoughtlike e rocklike sem colapso.
Isto é,a força quântica de Bohm é a força
de uma coisa thoughtlike numa coisa rocklike, e uma vez que a mecânica
quântica não permite de modo algum a contra-força da
coisa rocklike na coisa thoughtlike , então é
necessário a teoria física pós-quântica de Sarfatti
onde a ação de reação (back-action) é
essa contra-força da atual posição da partícula
num momento do tempo para mecânica das partículas ou da configuração
do campo clássico sobre todo o espaço num momento no tempo
em teoria de campo quântico na sua onda thoughtlike associada.
As propriedades de onda quânticas das partículas são
causadas por um novo tipode quantum potencial dependente de forma não
–local. Assim é que o pensamento plasma a matéria do
cérebro. As propriedades de partículas quânticas
dos campos clássicos são causads por um potencial superquântico
similar. O fóton é um exemplo disso.
Há uma diferença entre as ondas clássicas rocklike
e as ondas quânticas thoughtlike. As ondas rocklike são
locais no espaço 3D rocklike ordinário. Incluemas ondas
eletromagnéticas de maxwell. Emcontraste, as ondas quânticas
thoughtlike são locais num espaço de configuração
em mais altas dimensões o que as fazem NÃO- LOCAIS em espaço
3D rocklike ordinário de largura, altura e espessura.
Uma outra concepçãoimportante no contexto da mecânica
pós-quântica é a informação ativa de
Bohm.
Basil Hiley mostra que o elétron é de fato uma partícula
com uma posição bem definida x(t) que varia continuamente
e é causalmente determinada. Observe que o caminho x(t) da partícula
rocklike é causalmente determinada em mecânica quântica.
Em contraste, com a back-action pós-quântica (i.é.,
o Espírito Santo, o Sopro de Deus, usando imagens leigas), a partícula
agora ligada à onda piloto quântica thoughtlike se torna ativa
e participa na sua auto-determinação até mesmo opondo
as pressões seletivas naturais Darwinianas não-auto
determinadas em alguns casos robustos. Começa-se a explicar os milagres.
Essa partícula nunca se separa de um novo tipo de campo quântico
que fundamentalmente o afeta... este também muda continuamente e
é causalmente determinado.
Pesquisa recente na IBM em quantum teleportation sugere que o padrão
de onda piloto quântico thoughtlike da informação
implicada de Bohm pode ser “teleportado” entre partículas diferentes
rocklike. Assim,umcérebro pode experimentar a experiência
atual de um outro cérebro distante dele no tempo e no espaço!
Observe que também para a partícula, a determinação
causal da onda se transforma em auto-determinação do ser
vivo, quando a back action predomina. A partícula rocklike
e sua onda piloto associada thoughtlike alimenta a informação
de correção do erro prá diante e prá trás
entre as duas para se tornar um sistema adaptativo pós-quântico
autodeterminado consciente.
O ponto importante para se compreender aqui é que isso não
é possível em mecânica quântica. Bohm explica
porque:
Finalmente deve ser apontado que diferentemente do que acontece com
as equações de Maxwell por exemplo, a equação
de Schrödinger para o campo quântico não tem fontes,
nem tem um ouro modo qualquer pelo qual o campo pode ser diretamente
afetado pelas condições das partículas.
Esta é a observação mais importante na obra de
Bohm [Bohm51:30].
Esta é a semente a partir da qual a física pós-quântica
do século XXI vai nascer. O que Bohm diz é que a mecânica
quântica tem ação de retorno zero. Back action
significa justamente o contrário. O campo pós-quântico
(ou onda piloto) temfontes e é diretamente afetado pelas condições
pelas condições das partículas.. Portanto há
uma relação bilateral entre a onda quântica e a partícula
clássica ou a posição da partícula na física
pós-quântica. Em contraste, há apenas uma força
unilateral na onda quântica sobre a partícula clássica
na física quântica.
Bohm insiste que isto constitui uma diferença importante entre
campos quânticos e outros campos até aqui usados.
Os físicos da ciência da consciência entram nesse
ponto em calorosos debates e utilizam conhecimentos que exigem domínio
da mecânica quântica e teoria de relatividade de Einstein.
Mas espero que o pesquisador perceba a minha intenção em
mostrar que os conhecimentos científicos já habilitam uma
discussão sobre o ser e a coisa em que a visualização
costumeira como antagônicos não resiste. Já Einstein
tinha demonstrado a relação e a conversão entre energia
e matéria. Agora já se ataca de frente as propriedades do
ser ou da alma.
I 1.5 Martin Heidegger: a coisa, a obra-de-arte, a verdade e o Poema
A incapacidade de Heidegger de apreender a coisidade (thingness) da
coisa e depois a coisidade do produto e da obra-de-arte faz com que tome
um desvio. E passa a raciocinar a partir da obra-de-arte para apreender
a sua coisidade. No entanto se Heidegger fracassa na sua busca da relação
entre a coisa e a obra-de-arte tão evidenciada na obra de Rauschenberg,
Rilke e Pollock , é extremamente bem sucedido ao relacionar a obra-de-arte
com a verdade. E conclui que a essência da obra-de-arte é
um advir e um devir da verdade. Embora não tenha trabalhado
os aspectos imanentes do que significa isso, ao colocar que a verdade surge
então como Poema e que a arte é portanto essencialmente
Poema abre as portas para se ver o mundo das coisas e dos fenômenos
como informação.
Não só se aproxima das teorias de consciência como
indica o caminho do modelamento. Ou seja até uma obra-de-arte é
modelável. Afirma Mas a língua não é
– e sobretudo não prioritariamente – a expressão oral e escrita
do que deve ser comunicado. É mais que a simples manifestação
do que jaz escondido, ou significado como tal em palavras ou frases: pois
é exatamente a linguagem que faz advir o Sendo enquanto Sendo
à tona [Heid80:82-88].
Enquanto Peirce e Hjelmslev explicam o nível semiótico
dascoisas em suas teorias sobre o signo, a contribuição de
Heidegger se aproxima mais da teoria geral do signo de Peirce [Cola87]
que é raramente conhecida e permite discernir com clareza os níveis
transcendentes que operam na consciência humana (analisada na próxima
secção).
A contribuição de Heidegger é fundamental,
embora não holística como a de Rilke ou Rauschenberg’s thingness.
Heidegger afirma que para determinar a coisidade da coisa, não
é suficiente recorrer ao suporte de qualidades, ou então
à multiplicidade dos dados sensíveis em sua unidade ou ainda
ao complexo forma-matéria representado por si e que é tirado
do ser produto. Coloca o produto no intervalo entre coisa e obra-de-arte.
O produto é feito pela mão do homem e estaria mais próximo
da obra-de-arte. Esquece que o produto pode ser manufaturado pela
máquina e aí estaria próximo da coisa. A arte
contemporânea usou pneus, pás, caixas de papelão, etc
portanto produtos para expressar a obra-de-arte e a própria arte
como coisa. Na mecânica pós-quântica , a continuidade
é enfatizada tal como mostrado na Figura 1.
Curiosamente insatisfeito com a caracterização
da coisidade da coisa, Heidegger acredita que se o debruçar-se
sobre a coisa que dará peso e medida à interpretação
da coisidade deve partir e e ir em direção à pertinência
das coisas à Terra de novo conduz a equívocos. Bem
situar as coisas no Nível 1 da matéria geometria soa bem,mas
ignorar que aqui também é o domínio dos campos
elétricos, magnéticos e gravitacionais, etc apenas enfatiza
a concepção platônica da Terra como algo inerte.
E leva à seguinte dicotomia na discussão. Os dois traços
fundamentais da obra-de-arte são segundo ele instalar, revelar ou
erigir um mundo implantado na terra (no caso da arquitetura) e enfatizando
a terra que se desdobra na matéria ou material de que é feita
a obra-de-arte.
Heidegger argumenta que o ser-acabado (être-fini, das Fertigsein)
do produto e o ser-criado (*das Geschaffensein) da obra-de-arte têm
em comum sua dependência de uma produção. Na
criação da obra-de-arte, o desafio consiste em ter de tirar
a terra de sua obscuridade enquanto se retira em si mesma. Tem de
se fazer uso dela.Mas é um uso que longe de usar ou abusar da Terra
como de um material, a libera precisamente a ela mesmo. Este uso
da terra é como um trabalhar (oeuvrer) com ela que tem o ar
de uma utilização engenhosa do material. Daí
a aparência segundo a qual a criação que realiza uma
obra seria uma atividade artesanal e manual. Mas isso ela não é
jamais. A descrição de Rilke sobre o modo de trabalhar de
Rodin esclarece esse aspecto. A criação é
sempre um uso da Terra para revelar a verdade na confecção
da obra. Em revanche, a fabricação do produto não
é jamais imediatamente a realização do advir da verdade.
Quando o produto está acabado, é uma matéria informe
pronta para a utilização. Este ser acabado do produto
significa que este é abandonado a si mesmo, à sua utilidade.
Bem vimos como Duchamp começou a questionar isso desde 1917. Também
comoRilke, Rauschenberg e Pollock quebram as barreiras entre a coisa e
a arte, a coisa e o ser humano. E até mesmo a natureza e o ser humano
(Pollock). Até que finalmente o aparecimento da arte
ambiental denuncia o uso da Terra, enquanto mero material e recipiente
passivo levando à degradação do meio ambiente. Igualmente
as novas teorias sobre espaço e tempo conforme relatado logo a seguir
mostram a dinamicidade real dos fenômenos.
Desde 1° de junho até 31 de outubro na EXPO2000 em Hanover,
Alemanha cujo tema é Homen, Natureza e Técnica várias
obras-de-arte espalhadas ao acaso no Parque da EXPO2000 expressam a função
de uma obra-de-arte de acordo com a constatação de Heidegger
no sentido de fazer aflorar a terra. Só que essas obras-de-arte
se manifestam através do produto como coisas!
Passeando pela EXPO2000, o visitante encontra uma cabine telefônica
onde anarquicamente peixinhos se instalaram, transformando-a num lindo
aquário. Ou um carro com uma gigantesca árvore como que brotando
do meio dele lhe atravessa o caminho, diferentemente das obras-de-arte
que estão bem comportadinhas em museu. Ou o convite para mergulhar
num poço de 4 metros de profundidade para se visitar a Oitava Maravilha
do Mundo! Quem realizou a experiência atesta a sua beleza. É
ao mesmo tempo um convite à introspecção, processos
cognitivos característicos do fazer artístico [Expo00].
Também na Expo2000 é a primeira vez que os 53 países
e organizações que construíram seus próprios
pavilhões tiveram que se submeter às limitações
da ecologia com respeito à arquitetura como cartão de visita
superdimensional: o princípio de sustentabilidade, no sentido da
Agenda 21 deverá estar em primeiro plano para as construções,
como também esteve para o planejamento geral da EXPO.
Esta norma prioritária para construções
ecológicas que poupem os recursos naturais e que sejam construídas
com materiais reutilizáveis estimulou os arquitetos do mundo inteiro
a produzir projetos arrojadíssimos etotalmente novos. O Japão
não só apresenta seu origami gigante construído pelo
famoso arquiteto Shigeru Ban mas também o seu carro elétrico
construído em papelão. O pavilhão tem 3600 metros
quadrados todo em papelão reciclável [Deut00].
O golpe do petróleo pelos árabes forçou a preocupação
com a Mãe Terra desde o início da década dos setenta,
acentuando o seu lado energético. Na sua famosa equação
E = mc2, Einstein assegura que toda a matéria é essencialmente
energia concentrada e não-liberada e que ambas eram dois lados diferentesda
mesmaúnica entidade cósmica.
A demanda estética para a simplicidade encontra em Laugier ressonância
no século XIX. Busca na pequena cabana rústica o modelo sobre
o qual projeta toda a magnificência da arquitetura. Segundo Milizia
a cabana humilde, a primeira construção do homem continha
o gérme dos mais magníficos palácios mas tambémo
modelo que a arquitetura devia imitar, pois estava o mais próximo
do estado da natureza [Tzon76].
Deixar o que está sob as coisas transparecer expressa um desejo
de recuperar os elementos essenciais da vida, revelar e trazer à
tona as qualidades autênticas daqueles aspectos escondidos da realidade
que pertencem às coisas mesmas. Esse amor à infraestrutura
da matéria significa um anseio pela integridade, libertar a alma
que pertence à essência.
O desgosto com as afetações da civilização,
fez com que o design da paisagem nos EUA mergulhasse no que é fundamental,
entrando nos recessos mais íntimos de um chão fundamental,
uma selfa ainda misteriosa e livre, selvagem e perigosa como todas
situações liberadoras,ainda aberta a possibilidades que foram
todas excluídas de um mundo domado e sofisticado.
A palavra natureza envolve uma espécie de substrato ontológico
abaixo da superfície, vinda da palavra latina natus e se refere
primariamente a funções vitais e às forças
dascoisas, ao seu caráter, disposição e tendências
inatas, em suma , à sua essência, ao caráter essencial
de coisa, às qualidades que a tornam o que é.
Se Heidegger não é feliz em perceber o caráter
ativo e regenerativo da terra, Henry Plummer [Plumm89] capta que a casa
“natural” na sua forma mais genuína não apenas reproduz as
aparências naturais, mas penetra e causa o nascer deuma outra realidade.
Torna-se um canal aberto à terra, quando evita apenas se misturar
e ser engolida pela paisagem, e ao invés retira e revela a
matéria prima da vida. Tal casa “jorra” da terra, libera a terra
e se integra ao fluxo da vida do corpo do planeta.
De acordo com Heidgger, essa revelação é a função
primeira da arte da arquitetura, a qual ao erigir um mundo não causa
o desaparecimento do material mas faz com que se torne a terra remodelada,
glorificando abertamente o mundo do trabalho.
Ao erigir um mundo, a obra-de-arte expressa a terra...O trabalho move
a terra por si mesma, à abertura de um mundo e a mantém aí.
A obra-de-arte deixa a terra ser a terra.
Essa tendência parece ter percorrido os pavilhões da EXPO2000.Bambu,
papelão, cortiça, vidro, “enchido de areia”, trabalhados
através da techne, um método criativo abrangendo arte e artesanato,
não uma prática profissional ou operação técnica
no sentido moderno, mas um “modo de saber”, um ver e liberar a verdade
das coisas a partir de seu estado oculto, um descobrir de ‘seres’ se aproximam
do ideal de arte desenvolvido por Rodin e tão bem captado por Rilke.
Assim os pavilhões se tornam...um poema no espírito emancipado
da cortiça, do papelão e do bambu.
Os elementos arquitetônicos são esculpidos de modo a revelar
a estrutura inata e o padrão de cada galho da árvore, liberando
forças internas que estavam lá desde o início, dando
forma a poderes subjacentes em latência no material, não impondo
objetivos que ferem os princípios de auto-sustentabilidade da Mãe
Terra, onde há emissão zero de poluição.
Respeitar a madeira, significa “ouvir”o que o material quer ser por
si mesmo, deixá-la dizer o que fazer.
Brancusi, escultor moderno, se afina com esse modo de ser e acrescenta:
é enquanto você esculpe..que você descobre o espírito
do seu material e as propriedades peculiares a ele. Sua mão pensa
e segue os pensamentos do material.
Essa penetração e liberação da anatomia
imanente da madeira acompanha outro tipo de emancipação,
uma mineração e liberação dematéria
prima no inconsciente humano, abrindo as portas para a zona fronteira da
realidade psíquica que foi tão bem mapeada pelas descobertas
psicoanalíticas de Freud, Jung e dos artistas surrealistas.
O Homem nu, em pé no deserto, sua cabeça abrasada pelo
sol e atgenta ao espaço infinito – o egoísmo se foi. Torna-se
um globo ocular; o nada; vê tudo; as correntes do Ser universal circulando
através dele; o homem é parte ou parcela de Deus.
Talvez seja assim que o trio de arquitetos holandeses Nathalie de Vries,
Winy Maas e jacob van Rijs esteja sentindo ao propor o Sanduíche
ecológico compacto como é conhecido o Pavilhão Holandês
da Expo2000. O homem destrói a natureza e, quando esta se torna
um elemento vital como no caso da Holanda, construída abaixo do
níveldo mar, o sonho de Heidegger se realiza e a obra-de-arte revela
um mundo que tornou a própria terra transformada num sistema
biotecnológico e de fato expressa o edifício não só
como remodelagem da superfície da terra mas também como gerador
de energia. Heidegger nunca imaginaria um edifício como uma unidade
autopoiética. E porisso a sua visão da terra no seu ensaio
sobre a Origem da Arte [Heid52c] é essencialmente platônica.
Jamais conceberia que as relações poderiam se inverter ou
seja ao se revelar a terra em seus aspectos imanentes como no meu modelo
de ecodesign, esse provoca um novo modo de pensar e uma nova relação
com o conceito de revelar um mundo. O Pavilhão Holandês é
uma demonstração de produto-arte. Tem a finalidade de mostrar
a importância de se revelar a terra de uma forma autopoiética
brilhante e abre possibilidades de novos modos de pensar como se
vai inserir o ser humano nesse espaço em harmonia com a natureza.
Mas não realiza isso na EXPO2000.
A figura 2 mostra esse pavilhão de oito andares e 40 metros
de altura, onde se intensifica o edifício e a paisagem para
que as condições de vida na Holanda permaneçam toleráveis
[Mele99].
Reúne em si todos os tipos de paisagens da Holanda: dunas de
areia, estufas de plantas, bosques mistos,um lago com ilha, uma tapada
e um parque de cata-ventos em cima do teto, produzindo energia. Este
panorama de camadas sobrepostas no menor espaço possível,
oriundo do país com a maior densidade demográfica, possui
um sistema próprio de abastecimento de energia e circuito de água
fechado. Muitos novos tipos de geradores de energia aqui estão integrados.
Um parque de cataventos está montado no teto, o edifício
está equipado com células fotovoltaicas, a energia é
gerada, queimando biomassa cultivada dentro do edifício e o calor
é reciclado. Essa concentração de tecnologias é
bem sucedida para tornar o edifício auto-suficiente. O surplus
devia beneficiar a comunidade. Todavia, os arquitetos assumiram que têm
a liberdade de usar a energia gerada no edifício pelo edifício
para seus próprios propósitos. Assimexploram as tecnologias
avançadas geradoras de energia paraq realizar uma de suas fantasias,
um edifício sem fachadas.
A forma aberta como paradigma do Movimento Modeno levada ao extremo.
Cortinas de ar e uma abóbada que repele a chuva e o frio sem necessidade
de fronteiras visíveis. A enorme quantidade de energia requerida
para tornar essa aproximação possível é gerada
por meios ambientalmente benignos. O pavilhão parece consumir uma
quantidade de energia enorme mas isso não é relevante, uma
vez que não consome nenhum tipo de energia fóssil insubstituível.
Sacode as convenções, produzindo uma verdade inovadora
e desafiadora. A integração eficiente de instalações
geradoras de energia num edifício influencia a aparência exterior
do edifício, mas ao mesmo tempo oferece ao arquiteto tremenda liberdade.
Torna-se possível desenvolver novas formas que são simbólicas
da nova função e portanto da era da sustentabilidade e das
tecnologias aplicadas. Esse edifício tanto pode se suprir
de energia quanto vender energia elétrica.
O corte da figura 3 mostra que o pavilhão gera eletricidade
de vários modos: o parque de cataventos no teto, as células
fotovoltaicas no segundo andar e a biomassa é cultivada e incinerada
no térreo. O terceiro andar é separado da atmosfera
ambiente por uma cortina de ar comprimido e a abóbada de ar do teto
é usada para projetar o andar do teto da chuva.
A figura 4 mostra que a água tem funções
diferentes em cada andar. Desce em pequenas quantidades a partir da fonte
no teto, assumindo uma forma diferente e preenchendo uma função
diferente em cada andar. Atua como uma fachada, mas também
é usada para resfriar o auditório e para dar descarga nas
toiletes. Finalmente é coletada em pântanos onde é
purificada, pronta para ser bombeada de volta à fonte do terraço
do teto.
A estrutura vertical do edifício tem o mérito de deixar
uma grande proporção do terreno do pavilhão livre,
não impedindo o abastecimento do aquífero. Esse projeto
economiza espaço, energia e água [Mele99].
O novo assentamento de Flintenbreite na cidade de Lübeck no mar
Báltico na Alemanha está implementando um conceito sanitário
integrado com toilets à vácuo, esgoto à vácuo
e uma usina de biogás para águas negras (blackwater).
A principal tarefa do saneamento além dos altos padrões
higiênicos é manter o solo fértil. O saneamento com
a mistura de ciclos de comida e água carrega todas as substâncias
que são extremamente prejudiciais para o mar devido à acumulação
e extremamente necessárias na terra (diminuição de
fertilidade e recursos fósseis).
Os novos sistemas de gerenciamento e reciclagem integrados respeitam
asdiferentes qualidades de matéria dos assentamentos humanos: águas
negras com bio-resíduos, água cinza, águas pluviais
e resíduos não-biodegradáveis.
Mais ainda as descobertas cada vez mais abrangentes da astronomia,
física, ecologia deixam transparecer que a Terra (o terreno) é
o universo inteiro. Para se criar um punhado de terra tem de se inventar
o universo. Um milésimo de segundo depois do big ban a uma
atemperatura de trilhões de graus celsius, a energia se transformou
em quarks e outras partículas exóticas. Depois de um
segundo, neutrons e prótons nasceram de quarks a dez bilhões
de graus celsius. Depois de três segundos, hélio e outros
núcleos de átomos nasceram de prótons e neutrons a
dez milhões de graus celsius. Depois de 300 mil anos, os átomos
começaram a se formar e galáxias a se condensarem a 3000
graus celsius.
Acredita-se que a terra e outros integrantes do sistema solar se formaram
há cerca de 4 000 milhões de anos por condensação
a partir de uma nuvem de gás e poeira. Esta se contraiu devagar,
originando o sol primitivo no seu centro – uma nova estrela- cercada de
uma massa de gases cósmicos na qual condensações locais
geraram os planetas. A terra primitiva fria se aqueceu através
da matéria acumulada e decadência de materiais radioativos.
O calor fundiu alguns constituintes e não podia escapar da massa
comprimida. A matéria mais pesada desceu para o centro da
terra devido à gravidade. Esta adquiriu um núcleo,
um manto e uma crosta externa.
Um perfil geológico num terreno, revela sua evolução
a partir da era arqueozóica (1910.106 anos atrás) à
era cenozóica, o período quaternário.
Enquanto a superfície da terra esfriava, a água começou
a se juntar na supefície para formar os oceanos embrionários.
A atmosfera se formou nos últimos 1000 milhòes de anos, quando
a vida vegetal começou a se estabelecer e contribuir com o oxigênio
para as emanações vulcânicas de um estágio anterior.
Um perfil geológico da Grécia mostra que em cada período,
o solo que se forma acima dos depósitos é cada vez mais fino
e menos desenvolvido e capaz de suportar vegetação.
Como pode o homem para esse comportamento entrópico em relação
ao terreno? A tríade de temperatura, razão do potencial de
evapotranspiração e precipitação anual total
média em mm determina uma gama de zonas de vida natural ou ecossistemas
em termos de formações de plantas.
E é exatamente a noção de gravidade que nos permite
superar as noções passivas sobre a terra concebidas por Platão.
A gravidade controla os movimentos de estrelas e galáxias. Mas o
que a gravidade faz quando toda a matéria numa estrela é
esmagada, quando esta explode como uma supernova e seu remanescente colapsa
num buraco negro? Enquanto não se fundir a teoria de relatividade
com a mecânica quântica, não pode haver uma teoria de
gravidade quântica.
Na mecânica quântica, a gravidade é concebida como
contínua transmissão e absorção de gravitons
pelas massas.
Uma incongruência emerge aqui. As teorias que tratam as forças
como partículas assumem um background imutável de espaço
e tempo. Assim o graviton se tornava ator e palco simultaneamente. Um graviton
entraria no palco do espaço-tempo , mas ao fazer isto, curvá-lo-ia,
como se esse fosse de gel. Então uma teoria apropriada da
gravidade quântica permitiria ao espaço evoluir e mudar em
resposta a forças ou à presença de massa. A
teoria das supercordas é uma união da teoria da relatividade
geral com a mecânica quântica. Tenta mostrar que a gravidade
e todas as outras forças são apenas manifestações
diferentes de uma força ancestral – uma força unificada e
que existiu na aurora do tempo.
Ashtekar [Bart93] introduziu em 1986 uma aproximação
sobre como a gravidade pode atuar, quando se examina fatias do espaço
cada vez menores. Sente-se o espaço como um meio uniforme
e contínuo. É uma ilusão como as mesas sólidas.
Ashtekar, Rovelli e Smolin acreditam que o espaço é construído
por laços, unidades discretase separadas, cujo diâmetro é
de um minúsculo 10-33 cm (um milhão-bilhão-bilhão-bilionésimos
de um cm). É uma medida do comprimento de Planck – o tamanho de
um gráo mínimo concebível no nosso universo, derivado
daunidade mínima de energia. Se um ‘átomo fosse explodido
até atingir o tamanho de nossa galáxia, que cobre 100 000
anos-luz, um desses laços (loops) quânticos não seria
maior que a célula humana. O que é um laço quântico?
Pode ser pensado como o equivalente gravitacional de uma linha de força
gravitacional. Nada existe dentro ou fora de um laço
nem mesmo o espaço vazio; o loop define por si mesmo o espaço.
Smolin diz que não se pode falar das propriedades de uma laço
do espaço, como não se pode falar de temperatura ou densidade
de um único átomo. Então o espaço que nos é
familiar emerge apenas devido a números incontáveis de
laços se interconectando por polegadas, milhas e anos-luz.
Cada laço do tapete espacial seria separado e distinto ainda ligado
a seus vizinhos. Rovelli construiu um modelo tridimensional,
uma malha de círculos metálicos usando centenas de anéis-chave.
Aqui se pode imaginar um graviton como um único laço bordado
num ponto da rede. Uma grande coleção de gravitons distorceria
a tecelagem, como a massa distorce o espaço-tempo. Uma teoria de
gravidade quântica bem desenvolvida faria nossas idéias sobre
o big ban parecer tão ridículas quanto o modelo de Ptolomeu
da terra como centro do sistema solar [Lour95].
O que entristece nas teorias arquitetônicas hoje em dia é
exatamente essa falta de visão integrada. Os desconstrutivistas
concordam que é necessário mudar as coisas mas é só
dar uma olhada no jeito como fazem isso, completamente longe de uma perspectíva
científica e o desânimo seria esmagador, se não fosse
possível o exercício interdisciplinar.
Mesmo que Heidegger não tenha percebido o assomar das teorias
de auto-organização, afinando e precisando a nossa experiência
real dos fenômenos que nos cercam, foi feliz ao expressar que a arte
é o revelar da verdade numa Gestalt. Agora pode-se ler aqui Gestalt
como imagem, coisa, figura geométrica, objeto, artefato, projeto,
etc.
É o que advém pela criação como produção
da revelação ou eclosão do sendo (becoming).
A verdade, esclarecimento, reserva do sendo surge então como Poema.
Toda arte é essencialmente um Poema no sentido amplo da palavra.
Assim a arte revela a Verdade como Poema. Deve-se aquiescer a ela e
deixá-la reinar.Em essência, poema não significa prosa.
As descobertas da física atômica revolucionaram não
só a pintura de Kandinsky mas também a poesia moderna.
Nomeu mestrado, mostrei através do poeta Haroldo de Campos que fez
uma incursão ao mundo oriental para mostrar que a poesia se assemelhava
à língua chinesa que para se considerar a arquitetura uma
linguagem essa só podia se assemelhar ao chinês (Lour85].
Mais tarde para criar o modelo computacional correspondente ao modelo de
ecodesign criado, o primeiro necessariamente tinha de captar a natureza
hermenêutica e autopoiética do último. E o paradigma
orientado a objetos através do seu mais novo ramo o protótipo
satisfaz a expectativa [Lour97a].
Vou deixar o crítico de arquitetura Henry Plummer [Plumm89]
explicar o que é poesia moderna. Assim o pesquisador vai perceber
que a natureza do paradigma orientado a objetos baseado em protótipo
é radicalmente difeente de tudo o que se fez até hoje em
inteligência artificial e na engenharia de software que orbita ao
redor da linguagem de programação procedural C.
Sob a influência dos novos conceitos de física atômica,
em 1913 Ezra Pound já dizia que a coisa que interessa na arte
é um tipo de energia, uma força que transmuta, funde e unifica.
Perdeu-se o mundo radiante onde um pensamento se sobrepões ao outro
com uma fronteira definida. Em seu lugar surge um mundo de energias que
se movimentam...magnetismos que se transmutam em forma (ondas clássicas
rocklike) que são visíveis e ou tangenciam o visível.
Charles Olson também transformou o poema num campo, e em forma
aberta, suas palavras arranjadas em matrizes densas de relações
temporais e espaciais que simplesmente aboliram a sintaxe linear.
Entendia que a busca compulsiva americana por paisagens alpinas,
tornando a paisagem um órgão da consciência e troca
cultural principal da experiência pessoal, forçando artistas
a abandonarem o Hudson Valley passando pelo Parque Nacional Yosemite até
atingir o Monte Hood no Oregon da costa oeste tinha acabado. Para se manter
auto-criativo a busca tinha de se voltar para dentro, explorar as fronteiras
do lugar local onde se está no aqui e no agora, entrar num tipo
de eternidade elástica, uma ressureição perpétua
no presente.
Aqui não há entradas fixas, meios e pontos finais, mas
antes acumulação de acontecimentos que mudam e evoluem continuamente,
desvendando trilhas e emergindo de acordo com o jogo hermenêutico
do olho e da mente.
Tal poema deve em todos os pontos ser um construct de alta
energia e também de descarga de energia.
Essa composição de ‘campo’ se consegue reunindo percepções
cinéticas e liberadoras, uma composição onde uma percepção
deve imediatamente e diratamente levar a uma percepção mais
adiante. Os ecólogos também tiraram proveito dessa idéia
de campo e elaboraram novas teorias de ecossistemas[Joer92].
As convenções que a lógica forçou na sintaxe
são rompidas e todas as partes do discurso de repente na composição
por campo (de energia) são frescas para o som e o uso.
Os verbos perdem seu tempo preciso, sua cronologia rígida, conduzindo
a história ao prsente. Os substantivos se tornam tensos carregados
de energia do inconsciente.Assim todas as formas componentes se tornam
cinéticas (era interessante o pesquisador dar uma olhada em arte
cinética e ótica) e são impedidas de se fecharem,
de se congelarem num rigor cadavérico, assumindo qualidades animais
vivas. Ao invés das palavras se subordinarem à hierarquia
do todo,as partes ganham valor independente e movimento, democratizando
a estrutura linguística que agora é altamente plural
e cujas partes são individualmente ativas. Associações
fragmentárias e puramente locais emergem em planos múltiplos,
dando origem a uma nova ordem que Olson chamou a sintaxe de aposição,
uma ordem igual a de um mapa, antes que a de uma equação
ou lei que deve ser seguida, onde a lógica governa sobre as partes
e as ajusta a um esquema sistemático [Plumm89:190-191].
Do ponto de vista da construção de um modelo dependente
do domínio ou do modelo computacional tal tratamento da verdade
como poema nos situa no nível dos processos de pensamento, contribuindo
para indicar a necessidade de uma estrutura de linguagem que permita o
livre fluir da imaginação.
Intuo que a teoria geral do signo de Charles Saunders Peirce nos auxilia
a transitar livremente nas fronteiras entre a imaginação,
o pensamento e o conhecimento ou seja a nadar no mar da informação.