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Maio de 1995 (no 18)

 

 

Uma nova ciência da mente?

Henrique Del Nero

 

 

 

A Inteligência Artificial (IA) despontou no fim do século passado, com a lógica simbólica, que discutia não apenas a verdade de uma sentença, mas a validade de um argumento (conjunto de sentenças quantificadas, do tipo Existe um X tal que se X é homem, então X é mortal). nos anos 50, portanto, o que basicamente caracteriza a IA simbólica é o conhecimento das regras ou relações entre entidades. Se substituimos variáveis e predicados (do tipo Se P, então Q) por entidades, conhecendo-lhes as regras de relação, temos IA simbólica. Mas apenas se poderá conhecer e manipular o conjunto das entidades mentais (idéias, percepções, sensações, intenções, representações) ou o resultado inteligente de uma operação. O melhor exemplo são os sistemas especialistas (capazes de imitar a conduta de alguém com experiência em determinada tarefa). Há 40 anos eles deram origem aos programas que jogam xadrez, entrevistadores psiquiátricos, como o Elisa, e um sem-número de aplicações.

A IA simbólica conclui que, sendo possível rodar um mesmo programa em qualquer tipo de hardware, existe relativa independência dos níveis. Assim, o hardware seria o cérebro. O sftware seria a mente, que, na segunda metade do século XX, deixa de ser algo estéreo, obra do sopro divino, descendo ao mundo do concreto, do humano, do formal, do científico. A bruxaria e a crendice deve dar lugar a uma visão científica do psiquismo.

Por que, então, tanto se fala em modelos artificiais da mente humana?

de acordo com o modelo clássico, a mente se divide em três categoria: pensamentos (modo cognitivo), sentimentos (modo emocional) e vontade (modo conativo). Diante da dificuldade de reproduzir as três em máquinas, elege-se o pensamento, em especial o inteligente, como objeto a ser reproduzido. Daí surge, paralelamente à IA, a ciência cognitiva - a que se ocupa dos fenômenos do pensamento. Mas algumas questões permanecem em aberto. Uma vez que a ciência cognitiva e a IA estão longe de explicar a mais nobre das funções da mente humana: a consciência.

De qualquer modo, na primeira metade do século XX, teoricamente, a máquina pensante está pronta. Os computadores mastodônticos, desenvolvidos a partir de quaisquer sistemas mecânicos revolucionam a década de 50.

Nos anos 70-80, como a proposta de modelar a mente humana não vinga totalmente, ganham maior importância os sistemas alternativos. E surgem as redes neurais, também chamadas processamento distribuido paralelo PDP ou IA conexionista. Esses sistemas ditos completos reunem inúmeros elementos amplamente conectados entre si, processando uma entrada e gerando uma saída. a construção da IA conexionista baseia-se mais na matematica (cálculo tensorial, álgebra linear), e na física mecanica estatística). o que se considera aqui não é mais o estilo de processamento baseado em regras conhecidas, mas o resultado que emerge da interação complexa entre os elementos _ os "neurônios" _, o que engendra soluções computacionais virtualmente não- algoritmicas. Porém, o que confere a esse modelo conexionista status de cognitivo ainda é o uso de entidades mentais como predicados e entidades _ tal e qual na IA simbólica _, embora se observe um "estilo cerebral de estabelecer relações"; isto é, com conexões entre multidões de neurônios.

Nos anos 90, a teoria dos sistemas dinâmicos incorpora as noções matemáticas de bifurcação e caos, que permitem à IA, entre outras aplicações, identificar, analisar e manipular sinais eletroencefalográficos cerebrais. E mais, lançar algumas hipóteses substantivas acerca de processos mentais que dão origem à cognição (pensamento). A neurodinâmica quântica, ainda mais recentemente, analisa a cognição e a mente com base na matemática e na física quântica, sem afirmar, entretanto, que há fenômenos quântico por detrás deles. Existe, porém, uma corrente que acredita nesse tipo de ocorrência e a defende como sendo a raiz da consciência e do pensamento. nesse sentido, o uso da macânica quântica pode ser instrumental (quando se usam apenas seus formalismos) ou essencial (quando se supõe que o fenômeno quântico no nível dos microtúbulos cerebrais seja a condição para a aparição da consciência em sistemas físicos).

A contribuição das quatro teorias e, acima de tudo, o esforço de especialistas que buscam não apenas soluções práticas, usando ferramentas formais, mas os fundamentos teóricos de cada modelo, começam a dar origem, nos dias de hoje, a uma ciência da mente mais sólida. tanto a que se ocupa do normal quanto a que se trata do patalógico. No futuro, também hão de se beneficiar as teorias do Homem: economia, sociologia, direito, administração pública e privada (processos decisórios, dinâmicas interarivas, solução de problemas), etc. Enfim, no século XXI, a ciência cognitiva alcançará a maturidade, com resultados teóricos e práticos.