FORMAS DE ANSIEDADE: reconhecendo os sinais de advertência

Dr. Henrique Schützer Del Nero (IEA-USP)

 

Este texto tem a finalidade de prepará-lo para reconhecer uma série de problemas psíquicos que podem acontecer durante este ano.

Ninguém está te chamando de louco ou qualquer pessoa da sua família, porém, desregulagens emocionais são mais comuns do que qualquer pessoa possa imaginar. Tendem a ocorrer em 10 a 20 % da população e, no mais das vezes, ficam sem diagnóstico ou são incorretamente tratadas.

Meu objetivo é simples: espero que ao final da leitura deste texto, juntamente com a palestra e com alguma ajuda de supervisores, você esteja apto a pegar qualquer situação de anomalia que se apresente em tempo de corrigí-la.

A correção, no mais das vezes, é simples, bastando para isso algumas conversas e, às vezes, um pouco de remédio. Remédio para a cabeça é a coisa mais normal do mundo. Desde que corretamente prescrito.

Cérebros são máquinas extremamente complicadas. São criativos e trabalham a vida toda na manutenção da consciência, do pensamento, da inteligência, das emoções. Porém, como qualquer máquina, às vezes desregulam. Nessas horas não adianta nada ficar brigando com o motor, dando chutes no carro quebrado na estrada. Cabe, na verdade, saber quem e quando procurar.

Até alguns anos atrás era comum fazer uma longa dissertação sobre a bobagem de não querer tomar remédios para a mente desregulada. Espero que não tenhamos que fazer frente aos argumentos ignorantes de que reza brava, conselhos da vizinha, tarô, fé, etc. são substitutos para a medicina. Não são.

Imagine que você tem uma febre baixa, coceira e dor nos dedos. O leigo costuma pensar isoladamente nos sinais e sintomas. Como os três sintomas são leves tende-se a não apelar ao médico. Passado algum tempo, aparece um problema sério. Consultando o especialista, você ouve que aquela trinca - febre, coceira e dor nos dedos - era o início de um processo. Se tivesse sido tratado na época certa evitaria um monte de problemas. É exatamente isso que vamos fazer, como se têm feito no mundo todo. Vamos ensiná-lo a diagnosticar os menores sinais e sintomas de estresse, prestando atenção se não cedem em 4-6 semanas. Se não passarem nesse período você deverá conversar com seus coordenadores, com seus pais, procurando para consulta algum psiquiatra da rede pública (há vários locais gratuitos) ou privado. Pela falta de uma dose baixa de remédio muita gente acaba perdendo rendimento no final da corrida e se saindo pior do que devia (calcula-se, conservadoramente, que esse número seja de uns 10% dos candidatos). Não consigo imaginar nada mais injusto que não conquistar a vaga que se merece. Não quero que o aluno desmazelado e pouco estudioso conquiste as melhores vagas somente à custa de sua calma; quero é que o aluno zeloso não se deixe prejudicar por uma ansiedade boba e fique sem diagnóstico e tratamento correto.

A mente e o motorista, o cérebro e o motor, a personalidade e a carroceria

Vamos, então, fazer uma comparação para que você possa entender as três ordens de problemas que podem ocorrer com uma pessoa, seja no ano de vestibular, seja durante sua vida inteira.

Um indivíduo é como um carro sendo conduzido por um motorista. Há no conjunto três elementos distintos e, dentro de cada um, outras tantas subdivisões. Há o motor, o motorista e a carroceria. Ou, se pensarmos no indivíduo, há o cérebro (motor), a mente (motorista) e a personalidade (carroceria).

É uma simplificação didática e grosseira, mas serve para falarmos de três ordens de problemas que podem ocorrer e como tratá-los.

Claro que quando o motor aquece não se deve mandar o motorista pentear o cabelo. Nem mandar o carro lavar porque está sem água. São planos diferentes e a correta caracterização de cada um pode fazer uma diferença brutal.

Problemas de motorista

Há uma série de problemas que o motorista pode gerar na condução do veículo. Desde usar drogas, até dormir no volante, puxar o freio de mão para o carro não andar rápido demais.

No caso da mente são comuns estes problemas e não adianta apelar para remédios. É o caso de conversar com os outros, seguir alguns conselhos, fazer um pouco de meditação silenciosa e perceber o que está errado.

Nesse caso se encaixa como uma luva o aluno que não estuda o mínimo de horas necessário para cumprir as tarefas mínimas, que falta a aula, que usa drogas para relaxar, que começa a embarcar na bobagem de ridicularizar o aluno aplicado. Culmina com a situação de não se estudar muito para não criar expectativa. "Se der, deu" costuma se defender aquele que confunde ausência de expectativa neurótica com saber cumprir o seu papel.

Esses e outros tantos problemas não são tratáveis com remédios e costumam se beneficiar de conversas e reflexão. Seus pais, amigos, professores e, em último caso, um profissional, podem ajudá-lo na tarefa de ensinar como o motorista (mente) deve conduzir o conjunto (cérebro + mente + personalidade).

Problemas de personalidade

Neste tópico entram gostos e tendências. Não adianta fazer todo mundo andar de carro preto que pode ser sinal de arrojo ou de funeral. O carro sujo é desmazelo, mas também pode indicar ausência de meticulosidade excessiva.

A personalidade, aqui tratada sem o caráter técnico do termo, é uma roupagem que sintetiza gostos, tendências e valores. As escolhas e posturas estão situadas nesse patamar. Se todo mundo fosse médico, não haveria quem consertasse o encanamento; nem o projetasse, nem bolasse uma solução para o racionamento ótimo de água numa cidade grande.

As escolhas devem ser pautadas por exame cuidadoso de uma série de variáveis. Problemas que ocorrem nesse item costumam dizer respeito à imposição de uma carreira por parte dos outros ou de si próprio. Também costumam advir de uma maneira de enxergar as faculdades como se algumas não fossem dignas e outras sim. O que faz a dignidade de qualquer instituição, e particularmente da profissão, é o profissional. Há inúmeros casos de carros verde-limão que se tornam cobiçados porque atrevidos e de outros, cinza-chumbo, que caem no marasmo da glória sem estilo.

Os problemas que advêm do quesito personalidade são em parte devidos a uma postura de confronto que muito jovens assumem diante das instituições; ou de excessiva resignação. O confronto se traduz em procurar inventar o que não está para ser inventado. "Aula dada, matéria estudada" é uma dessas máximas que só o tolo afronta. Porém, a resignação excessiva, a impressão de que somos todos sábios e somente você é uma pessoa que precisa provar alguma coisa é também patológica.

Certa vez, uma indivíduo me perguntou em que ano estava da faculdade de medicina e respondi que no terceiro. Ele respondeu orgulhoso, esnobando, que já era residente. "Isso só indica que você é mais velho" respondi.

Cuidado para não confundir jamais respeito aos mais velhos e às instituições com uma espécie de reverência como se nós detivéssemos todo o saber. Esse é um problema de personalidade, no sentido de carcaça do carro, que pode ser facilmente sanado procurando ser um pouco mais atrevido e procurando respostas mais agudas, sem esquecer de fazer a parte tradicional muito bem feita, perfeita se possível.

Problemas de motor

Esse tópico é o mais crucial. Ao contrário dos anteriores não costuma resolver com qualquer conversa ou mudança de postura. Costuma causar problemas e perda de rendimento. Saber diagnosticá-los, procurando ajuda em tempo será decisivo para uns poucos (calcula-se em torno de 10%) que venham a se enquadrar no item "problema de motor" ou cérebro engasgando.

Esteja atento durante o ano e para o resto da vida, em você e nos outros que estão ao seu redor. O que será explicado agora não é invenção minha. É o estado atual da medicina e os sinais e sintomas que serão relatados fazem parte de qualquer panfleto da Organização Mundial da Saúde nos seus programas de conscientização da população.

O cérebro desregula porque é extremamente complicado e sob pressão tende a começar a engasgar. Como é que se vêem os problemas no motor? Simples, olha-se para o painel do carro onde estão sinais e sintomas.

Grupos de sinais e sintomas, durando mais de umas 4-6 semanas deverão motivar uma consulta médica ou uma conversa com orientadores e pais.

Sinais e sintomas de advertência (Luzes no Painel):

Como disse anteriormente, é preciso entender que a mente é uma capacidade fantástica do ser humano. Reúne virtudes incríveis mas não pode fazer muita coisa se não contar com um cérebro que codifica/computa e decodifica a informação. Em nossa figura esse papel é do motor e por vezes algo não vai bem. Olhando de fora, ou mesmo de dentro, não se sabe se o motor está ou não bom. Porém um série de luzes no painel indicam quando é que o cérebro-motor está desregulado.

Digo desregulado e não quebrado, ou disfuncional em lugar de doente, porque grande parte dos problemas de motor que resultam nos chamados quadros psíquicos advém de problemas de regulagem. O motor está fora de ponto e portanto não cumpre trocar nenhuma peça, nem o motor todo, mas apenas restaurar o correto equilíbrio.

Vejamos, então, que luzes se acendem no painel e devem ser alertas para o motorista:

1) Sono:

O sono é uma das funções que melhor avalia o estado do sistema, porque desregula com certa facilidade, como conseqüência de alterações de outras funções. Normalmente mantemos uma certa constância no nosso dormir. O número de horas, sem interrupção, deve ser mais ou menos o mesmo ao longo da vida adulta.

Cuidado: não estamos falando de um número específico de horas, porque sabe-se que isso varia de pessoa para pessoa. Em geral, para um adulto, a média tende a ser de 6 a 9 horas. Claro que algumas pessoas dormem, normalmente, menos e outros dormem, normalmente, mais. Temos também que excluir duas condições excepcionais: a de ter que acordar numa hora determinada, dormindo poucas hora por exigências de trabalho e estudo concomitantes e os fins de semana e feriados em que se costuma dormir algumas horas a mais que o habitual.

A luz de alerta no painel corresponde a uma alteração no padrão médio de sono, avaliado ao longo de cerca de 2 semanas.

As mudanças mais significativas são: diminuição ou aumento do número de horas de sono, grande dificuldade de pegar no sono e, sobretudo, começar a acordar antes da hora habitual sem que se tenha programado o despertador para tal.

 

2) Motivação

Um sintoma subjetivo é sempre mais difícil de quantificar. Quer dizer, está mais sujeito a uma série de circunstâncias transitórias que nem sempre significam uma desregulagem do motor. De modo geral, espera-se que uma pessoa esteja de moderadamente a muito motivada em relação ao futuro, à escolha profissional, à carreira, às possibilidades de empreendimento.

Isto não significa otimismo ou bom humor excessivos, mas um 'pique' bom de trabalho, estudo e lazer são esperados. Se você nunca conseguiu estar nesse estado ou se tem oscilado muito ultimamente, alternando fases de intensa motivação com fases de desconfiança exagerada e persistente acerca do futuro, da escolha profissional, de seu valor, de sua capacidade, provavelmente trata-se uma importante luz acesa no seu painel, que deve ser levada em conta.

 

3)Concentração.Memória.Atenção

 

Esse item também é relativamente carregado de subjetividade. Em princípio cada um sabe o seu estado de base (normal, habitual), sua capacidade de concentração e atenção.

Se você estiver dispersivo, sem capacidade de prestar atenção no trabalho, no estudo e nos afazeres em geral, sem capacidade de memorização mais ou menos adequada depois de uma leitura, uma reunião, uma sessão de estudo ou de uma aula, há uma boa probabilidade de que alguma desregulagem esteja em curso.

Quando estamos falando de perda de concentração (atenção e retenção de informação) não podemos perder de vista o seguinte:

- Deve ser generalizada- não existe estado patológico que faça com que uma pessoa consiga prestar atenção em alguns assuntos e não em outros, que consiga reter informação de certos tipos e não de outros. Atenção não é gosto ou prazer, é capacidade de inibir outras vontades e tendências e cumprir o que está sendo exigido.

- Deve durar pelo menos 2-3 semanas

- Não deve melhorar com providências simples como- descanso, reordenação de rotinas, reflexão consigo (de preferência escrita) e com os outros acerca do tema.

- Deve ter descontinuidade mercante no tempo.

Sobre a 'descontinuidade marcante no tempo' cabe salientar o que já foi dito sobre o sono: de modo geral existem problemas agudos e crônicos. O fato de algo ser antigo não exclui a possibilidade de ser anormal, porém, aí deve-se fazer um exame em relação à média das pessoas.

Imagine que uma pessoa diz que tem uma incapacidade crônica de prestar atenção. Até aí é preciso verificar o grau, o que normalmente se faz comparando com a média da atenção que as pessoas da mesma idade e com formação semelhante são capazes de prestar numa determinada tarefa. Se você estiver abaixo, ainda que seja uma característica antiga, pode considerar uma luz de alerta.

No entanto, como estamos usando, no mais das vezes, um critério de exame de condições agudas, procure ver se você está perdendo uma capacidade de atenção, de memorização ou de concentração que você tinha, ou julgava ter, até há bem pouco tempo. Neste caso, a luz no painel deve estar se referindo a uma desregulagem importante.

4)Apetite - Descanso - Libido - Fadiga

Se você estiver perdendo o apetite com muita facilidade ou exagerando muito na comida, ganhando ou perdendo peso além de 5% de seu peso anterior, sem que tenha intenção de fazê-lo, considere como um sinal de desregulagem, desde que você não consiga reverter a situação em cerca de 2 a 4 semanas.

Se você estiver sentindo perda de energia, cansaço crescente, incapacidade de relaxar, desligar, ver um filme, dar umas boas gargalhadas, falar um pouco de besteira, sentir desejo e interesse pelo namoro e pela "paquera", procure ver se não está exagerando além da conta na importância que está dando às suas obrigações. Se é um erro ser omisso e desleixado em qualquer momento da vida, também não é nada bom ficar obcecado pelo dever. Isso tende a desgastar precoce e desnecessariamente o indivíduo. E pode significar que você está sendo compelido, por uma modificação no funcionamento do motor (seu cérebro) a se preocupar exageradamente com coisas triviais.

Se persistirem por mais de 2 a 3 semanas os sinais de fadiga, falta ou excesso de apetite, perda de interesse pela amizade e pela paquera e perda de capacidade de descansar e relaxar, considere que a luz acesa no seu painel não é apenas um curto-circuito.

5)Sintomas Físicos

Se você de repente começar a sentir batedeira no peito ou na garganta, suor nas mãos e nos pés, dor de estômago, enjôo ou náusea, pressão no peito, tonturas e sensação de cabeça oca, procure:

- se for intenso, consultar seu médico

- se for leve ou vier mais diluído no tempo e estiver associado com outros sintomas descritos nos itens acima, tentar relaxar um pouco e pensar sobre a possibilidade de estar mais nervoso do que imagina. Depois de tomar algumas providências simples e, se em tendo consultado um médico, não tiver sido diagnosticado nenhum distúrbio clínico específico (por exemplo, gastrite, enxaqueca, etc) considere um sintoma importante se durar além de 2 a 3 semanas.

6) Idéias-Pensamentos-Sonhos

A mais nobre das funções de nossa cabeça, o pensamento, é talvez a mais difícil de transmitir e esquematizar.

Tenha em mente que idéias excessivas acerca de um assunto, seja qual for, não são bom indicativo. Pesadelos e sonhos agitados constantes também não refletem um bom descanso e uma boa capacidade de colocar as coisas nos seus devidos lugares.

Mais que considerar variações do nosso pensamento como sintomas, queremos ressaltar que é no campo das idéias que devemos buscar a chave dos problemas. É na idéia, no pensamento e na expectativa de cada um de nós que vão se manifestar os problemas que tentamos evitar.

Não se trata de evitar as dificuldades, nem de afirmar que o caminho para se conhecer enquanto ser mental seja fácil. Chamamos apenas a atenção para o fato de que podem aparecer os sintomas e sinais acima descritos. Se aparecerem, você deve estar lembrar que as luzes do painel têm uma função importante, a de alertá-lo para possíveis desregulagens do seu motor-cérebro que, se não forem cuidadas, poderão prejudicar seu desempenho na vida.

Regulando seu cérebro quando necessário

Vimos, então, quais luzes indicam que há problema no motor. Isto é, que há alguma desregulagem cerebral que deve ser corrigida. A não correção normalmente leva ao agravamento e à cronicidade.

Uma série de problemas poderão ser corrigidos através de uma simples inspeção nas luzes do painel. Cuidado antes de fazer o papel daquele que diz que são frescura ou do que espera ver se apagam. Como nós mesmos advertimos, deve-se esperar algumas semanas para ver se apagam; se, no entanto, passar este período e não tiverem apagado é bom procurar um psiquiatra.

Curioso que talvez agora comece a ceder a impressão que algumas pessoas têm com psiquiatras. Antes os distúrbios eram os mesmos mas não havia a clara quantificação da perda material que estava envolvida. Agora já se sabe que ocorre uma perda de 44 bilhões de dólares por ano, nos EUA, somente com depressão. Calcula-se que 2/3 desse valor sejam perdas indiretas por baixa produtividade. Também a distimia ou depressão leve e crônica tem sido diagnosticada entre os males que afetam a produtividade das pessoas. Quando a coisa começa a mexer no bolso, particularmente de gente que ganha muito dinheiro, aí a exortação antiga de nós psiquiatras impressiona e tem recursos para campanhas públicas como a que vem ocorrendo já há um tempo nos EUA. Nessa campanha que está bem descrita num artigo do jornalista Gilberto Dimenstein "A ignorância faz mal para a cabeça" do jornal Folha de S.Paulo de 19 de maio de 1996 conta-se que diversas personalidades de destaque têm ido aos meios de comunicação relatar problemas por que passaram e que foram resolvidos consultando um psiquiatra e, no mais das vezes, tomando algum medicamento. Engraçado, pense sempre duas coisas acerca de motores desregulados:

1. Se fosse fácil tratar a mente, não haveria necessidade de 8 anos de curso médico e residência para fazê-lo. Seria esquisito que até para trocar o courinho de uma torneira é preciso aprendizado e treino e que para tratar da mente basta a opinião da vizinha.

2. Se o cérebro humano é uma máquina fantástica parece que está mais para um carro de corrida que para um robusto carrinho urbano. Carros de corrida costumam voar mas param toda hora para manutenção. Seria estranho que também aí houvesse uma conjunção difícil: o motor cérebro vai muito longe mas não precisa jamais de regulagem; e o que é pior, há um preconceito quando o piloto relata um barulho na suspensão. É melhor correr o risco dele se estourar num muro dentro de algumas voltas em lugar de dar uma olhada no aperto das rodas?

Avaliação rápida de sinais e sintomas que podem indicar desregulagem :

Todo e qualquer critério de avaliação é um recorte mais ou menos arbitrário.

O presente teste não pretende varrer todos os problemas de desregulagem mental, nem atingir uma precisão que somente um especialista pode ter.

Por outro lado, pode servir como uma pista de como se devem organizar os sinais e sintomas relatados anteriormente para que rapidamente se saiba se é o caso ou não de consultar um psiquiatra.

A idéia de consulta é bastante universal. Toda vez que temos uma dúvida costumamos responder que a melhor forma de encaminhá-la é ouvindo um especialista. A psiquiatria não foge a essa regra. Porém, como já dissemos em outras partes desse livro, pelo fato das pessoa acharem que sabem com funciona a mente, cabe salientar em que condições é mais recomendável que se procure o psiquiatra.

TESTE

O teste a seguir é bastante simples. Responda cada pergunta dando nota 0 se não estiver acontecendo o que está apontado. Dê nota 1 se estiver mais ou menos. Dê nota 2 se estiver acontecendo.

Todos os sinais e sintomas que serão motivo de pergunta deverão estar alterados por pelo menos 2 a 6 semanas. Aquele que considerar que se encaixa na pergunta, mas que apresenta o problema apenas há 2 ou 3 dias, volte a fazer o teste dentro de algumas semanas.

Dê 0 se não for o caso da pergunta. Dê 1 se for mais ou menos. Dê 2 se for o caso apontado. ATENÇÃO: esse teste considera que um sintoma ou sinal deve estar presente por pelo menos 2-6 semanas, todos os dias ou quase todos os dias. Uma pessoa que tenha o sintoma ou o sinal há muito mais tempo não o torna por isso normais. Pelo contrário pode apresentar um quadro crônico o que também deverá ser tratado. Portanto, considere no mínimo 2-6 semanas para consolidar um sintoma. Se for há muito mais tempo mais razão ainda. Afinal porque uma coisa é freqüente não quer dizer que por isso seja normal.

1. Sono

Seu sono tem aumentado ou diminuído espontaneamente de 2 a 4 semanas para cá, ou apresentado interrupções? Se não tiver apresentado alteração, dê nota 0. Se estiver apresentando dificuldade de pegar no sono e depois dormindo bem, dê nota 1. Se estiver acordando várias vezes, perdendo o sono, ou dormindo muito mais horas que seu normal, dê nota 3. Também dê nota 3 se você não estiver praticamente dormindo de 2 semanas para cá. (...........)

2. Apetite/Libido (interesse sexual)

Seu apetite tem aumentado ou diminuído consideravelmente de 2-4 semanas para cá? Você ganhou ou perdeu mais ou menos 3 Kg de 1 mês para cá sem que tenha feito regime para engordar ou emagrecer? Seu interesse sexual está muito aumentado ou diminuído de 2-4 semanas para cá? Se não se encaixar em nenhuma pergunta dê nota 0. Se mais ou menos dê nota1. Se se encaixar em cheio em alguma delas dê nota 2. (..........)

3. Concentração/Interesse/memória/agilidade mental

Você sente que sua concentração para toda e qualquer tarefa diminuiu de 2 a 4 semanas para cá? Você sente que seu interesse pelas coisas diminuiu nesse período? Você sente que sua memória piorou de 2-4 semanas para cá? Você sente que sua agilidade mental, seu raciocínio, pioraram de 2-4 semanas para cá? Se não for o caso de nenhuma pergunta dê nota 0. Se for mais ou menos dê nota 1. Se for algumas delas em cheio dê nota 2.

4. Humor/ansiedade/"pique"

Você sente que de 2-4 semanas para cá você está mais triste que o habitual? Ou que sua disposição piorou, sentindo muito mais fadiga que o habitual? Ou que sua cabeça parece estar pensando mais em acidentes, desfechos ruins? Ou que os pensamentos parecem excessivos, sem que se consiga desligar e relaxar? Ou que sua crença no futuro diminui ou parece estar cheia de dúvidas, temores e incertezas?

Se não for caso de nenhuma das perguntas, dê 0. Se for parcialmente o caso de alguma delas, dê nota 1. Se for alguma delas dê nota 2.

5. Sintomas físicos/ irritabilidade/impulsividade/agitação

Você sente que de 2 a 4 semanas vocês está com sintomas vagos, do tipo sensação estranha na cabeça, má digestão, dores, diarréia, formigamento nas mãos, etc que não foram explicados por um clínico como sendo provenientes de alguma causa corporal? (ATENÇÃO: este item somente deve ser considerado depois que se visitou um clínico e se descartou qualquer problema específico. Normalmente é o caso de muita gente que há muito tempo visita diferentes especialistas e nunca encontra explicação para a queixa somática).

Você está mais irritado que o habitual, com o pavio mais curto? Você está mais impulsivo, explodindo a toa? Você se sente mais agitado que o normal de 2-4 semanas para cá, com uma sensação de bolo no peito ou no estômago, com um aperto na garganta ou um friozinho na barriga?

Se não se encaixar em nenhuma pergunta dê nota 0. Se parcialmente dê 1. Se totalmente dê 2.

6. Você sente que sua auto-estima baixou ou aumentou muito de 2-4 semanas para cá? Que sua confiança em si e no futuro está muito abaixo ou muito acima do que sempre foram? Você está mais quieto ou mais falante que o habitual nesse período?

Dê nota 0 se não for o caso. Dê 1 se for parcialmente. Dê 2 se for o caso em cheio de alguma delas.

7. Você ou os outros acham que seu pensamento, suas idéias e sua crítica estão um pouco diferentes de 2-4 semanas para cá? Você ou os outros relatam idéias estranhas, pensamentos um pouco esquisitos, etc? Você ou os outros relatam agressividade ou isolamento exagerados nesse período? Se for o caso dê nota 2. Se mais ou menos dê nota 1. Se não dê 0. ATENÇÃO: este item procura identificar alguns quadros mais raros de psicose. Normalmente são mais evidentes e devem merecer consulta psiquiátrica imediata, ao contrário dos outros sinais e sintomas.

 

 

 

RESULTADO

Se você obteve de 0 a 4 pontos muito provavelmente não há necessidade de preocupação com seu cérebro no que tange às desregulagens mentais. (lembre-se isso pode mudar dentro de um tempo).

Se você obteve de 5-7 pontos, diria que está numa faixa de sinal amarelo. Procure identificar problemas, descansar um pouco, fazer uma consulta com um clínico, etc. Repita o teste dentro de 1-2 semanas. Se tiver caído para números menores, muito provavelmente não havia problema maior. Se estiver igual ou tiver aumentado procure a opinião de um psiquiatra.

Se você obteve mais de 8 pontos procure um psiquiatra para consulta. Isso não garante que vocês está com um problema de desregulagem, nem que deverá ser medicado. Mas é suficiente critério para aconselhá-lo a ouvir o especialista.

 

 

CONCLUSÃO

 

Aqui está um manual de condução e manutenção do veículo que comporta seu cérebro, sua mente e sua conduta. Quaisquer problemas deverão ser discutidos com colegas, amigos, namorada ou namorado (não precisa esperar passar o vestibular para namorar, salvo pretenda torna-se padre ou freira), pai, mãe, irmãos, professores, supervisores e coordenadores.

Estaremos todos trabalhando em conjunto para acudir qualquer problema que ocorra com sua parte psíquica, para que com um bom curso, você possa receber a vitória um pouquinho mais à frente.

Além de estar num curso da seriedade do ANGLO, perceba que a atual assistência que será dada, palestras comigo durante 4 diferentes fases do ano, preenchem a lacuna de avaliar como vão indo suas cabeças nesse item. Isso é curso sério, mais que um projeto de colocá-lo na faculdade. Faz-se o que é bom para educar da melhor maneira o aluno, inserindo-o na sociedade.

Bom início de vida adulta e até a próxima conversa.

Henrique Schützer Del Nero é médico psiquiatra formado pela USP. Bacharel e mestre em Filosofia pela USP. Está concluindo sua tese de doutorado em Engenharia Eletrônica na POLI-USP, onde desenvolve trabalho sobre circuitos cerebrais em condições normais e patológicas.

É coordenador do Grupo de Ciência Cognitiva do Instituto de Estudos Avançados da USP, desde sua criação em 1990. Tem mais de 40 trabalhos publicados no Brasil e no Exterior. Foi aluno do Anglo em 1977 durante seu terceiro-colegial, tendo entrado em seguida na Medicina-USP (Pinheiros). Regularmente faz palestras de orientação sobre distúrbios ansiosos para os alunos do Anglo. É o autor de O Sítio da mente: pensamento, emoção e vontade no cérebro humano (Collegium Cognitio) disponível a partir de março nas livrarias e no Anglo. Embora bem mais pesado, pode ser uma leitura que, feita aos poucos, ensine de maneira um pouco mais precisa o que é ter mente, até onde pode ir, e sobretudo o que não pode fazer, embora tenha muito oportunista por aí vendendo teorias mentirosas acerca dela. Uma ciência da vida mental não é patrimônio deste ou daquele profissional. É comum a todo aquele que estude o que há de moderno e aceito pela comunidade científica mundial a esse respeito.